terça-feira, 24 de março de 2015

A alegoria da caverna ou um Mundo mediato, pataniskas miaufas Platonicas lampionis




- Este fim de semana, no domingo para ser mais exato, decorreram eleições em dois países importantes da Europa: Espanha e França. Se aqui ao lado eram apenas na Andaluzia, ou seja, essenciais para os Andaluzes mas apenas isso, em França foram as eleições departamentais. Uma espécie de eleições federais ou estaduais. Um degrau acima das nossas Autárquicas, pronto.

Ontem tive noticias dos resultados, muito cedo, quase de noite, via rádio:

As eleições Francesas foram despachadas em 1 minuto, com referência à derrota dos Socialistas e à segunda vida de Sarkozy, com direito a reprodução da declaração do gajo pequenito que arranjou uma mulher gira e não consta que lhe bata. Também referiram o segundo lugar da Frente Nacional e a exigência destes para que Hollande se demita.

De Espanha chegou, seria da proximidade?, uma reportagem completa, com declarações ao molho, entrevistas de rua aos apoiantes dos vence... não, espera, dos vencedores não, dos segundos classificados. Assim como se o FCP fosse campeão e fossemos lá entrevistar a malta do Rio Ave por ter ficado em segundo. Isto porque a onda alternativa está a encher a Espanha. Quer dizer, a Andaluzia, porque não houve eleições em mais lado nenhum. Vai dai o Podemos, que admita-se é um nome do caraças para um partido, conseguiu uns 20 e tal por cento dos votos, acho eu, e ficou em segundo, atrás dos Socialistas. Assinalável para um movimento tão recente. Uns 5 minutos de antena.

- E então homem? Que tem isso? E já agora, não tragas um fino, traz antes uma caneca, que eu acho que isto vai demorar... - E riu um esgar sarcástico, a grande besta.

- Tem que as sombras da nossa caverna tendem a enganar-nos. Nem de propósito, Platão era Grego. A Europa, o Mundo, está em plena convulsão, as mudanças são inevitáveis, já nos explicaram isso e nós parecemos predispostos a entendê-lo. E agora...agora é preciso que voltemos todos a enterrar a cabeça na areia, ou nos cus uns dos outros, que apesar de doer e nem sempre cheirar bem, mantém a populaça distraída. Por isso, ignoremos todos qual é a onda que enche:

* Na Grécia, a retumbante vitória da Esquerda, extrema para uns, moderada para outros, teve duas consequências: Tsipras à janela com a Angela a fazer piadas sobre a Primavera; e a extrema direita, um niquinho antes dos nacional-fascistas, no poder. Sim, no poder. E enquanto debatemos o cachecol do Varoufakis, como se fosse importante vasculhar a lista de compras do tipo, excepto para o Senhor Monteiro da Silva, pois claro; enquanto nos querem fazer crer que o Syriza não se vendeu já, uns, ou que está corrompido de todo, outros; o que de mais importante alguém do Governo de Atenas disse ultimamente foi: Não nos mandem a guita não, se querem ver-nos a empacotar tudo o que é emigrante daqui para o raio que o parta, em vagões de gado, se for preciso. É o dinheirinho e já, ou transformamos isto numa via verde para a vossa a Europa, principalmente para tudo o que seja terrorista que se atire ao Mediterrâneo. Gregos Independentes, chama-se o partido, é Governo da Grécia

* Em França, a grande vitória da Esquerda foi... ter ganho a Direita! Isto é, antes o Sarkozy, conhecido revolucionário progressista proletário, do que a Frente Nacional. Antes a Direita que a Extrema Direita. E a verdade é que o discurso da senhorita Le Pen, igualzinho ao do seu velho pai com ar de pedófilo, nunca mudou. Mas agora parece fazer sentido para muitos eleitores franceses. Se tivermos em conta a percentagem de eleitores franceses de origem magrebina, africana e outras ascendências não-nativas, é um feito ainda mais relevante.

Continuam a projetar-nos sombras na caverna. Nós optamos invariavelmente por tomá-las pela verdade, pela Vida. E hoje, temos tanto onde nos podem mostrar o seu jogo de sombras. Abençoamos a ignorância pela paz que nos trará. Deixemos isso de tomar conta de nós para quem quiser. E eles estão a chegar.

- Uh Silva, que medo! Sabes que és um chato com essas coisas. Lá vem o Holocausto! Calma pa. Olha, de bola não falas tu. - E riu, desta vez um sorriso completo, de escárnio, a grandessíssima besta! - Então nós perdemos e vocês, pimbas, empataram. Que gozo, os que nunca vacilam não aproveitaram. Ou não sabias? É que está em todo o lado meu amigo, agora é que foram de carrinho. - Duas alarves goladas na cerveja. Oxalá te engasgues. - Não dizes nada? Nenhuma teoria sobre isso? Nem uma palavrinha de bola hoje, é?

- Mas, meu caro, ainda não falei de mais nada senão acerca do fim de semana futebolístico. Tu é que não lês as entrelinhas.




quinta-feira, 19 de março de 2015

The King has left the building...e foi direitinho prá Tasca!



- De todas as coisas, há uma que sei que te devo e pela qual te sou eternamente grato: Teres-me feito crescer numa casa cheia de música. Ás vezes pensava que em nossa casa estava toda a música do Mundo. E de certa maneira estava. Pelo menos tudo o que vai dos Motörhead ao Liberace, ou assim. - Rimo-nos os dois. E rimos muito poucas vezes juntos nestes tempos. Saboreamos. Empurro-o:

- Anda lá, é o teu dia, hoje o palco da Tasca é só teu. Arrasa-os, Silva! Ou lá como é que te chamas agora...












segunda-feira, 16 de março de 2015

Lucy in the Sky with Diamonds



Não a vejo no plano, mas tenho a certeza que é a voz da Catarina Furtado:

- A concorrente número dezanove, num vestido de Ana Salazar e sapatos Miguel Vieira, que lhe elevam o metro e sessenta e cinco, António Costa. - Palmas na audiência. - António promete erradicar a pobreza, eliminar o desemprego e anseia pela paz no Mundo e o fim da fome das criancinhas. Se for eleita Miss Portugal, pugnará pelo perdão das taxas municipais e pela prescrição das contribuições autárquicas em atraso.- Palmas na audiência.

O plano percorre os vips. Fila E, lugar 14. Sim, sou eu! Impecável em black suit, mas com o avental da Tasca. Levanto-me de braço no ar. O Jorge Gabriel, sentado ao lado do Jesus com a sua eterna pastilha imaginária, aponta para mim com nítido enfado:

- Sim Silva, diz lá.

- Obrigado. Oh mister, porque é que agora fala sempre na segunda pessoa do singular? Se tu não ganhas, pois perdes; jogas por dentro que é para não jogares por fora; e assim por diante. É estranho, é gramaticalmente errado e francamente irritante. Porque recarga de água substitui todos os pronomes pessoais, mormente o eu e o nós, por tu? Repare, se a sua mãezinha lhe pergunta "Jorge, como é que quebraste o vaso chinês?"; que sentido faz responder-lhe "oh mãe, se jogas FM e ganhas a Champions, tens que saltar e festejar, não te ralas com os vasos"? - Ele atira a melena de cor indefinida para trás. Quando me responde, já é a Edite Estrela:

- Meu amigo, as especificidades linguísticas serão sempre secundárias em relação ao ego dos falantes. No caso em apreço, o raciocínio é que os melhores, os mediáticos, falam assim, portanto os cabotinos seguem o exemplo, bom ou mau. Que importa que a origem esteja nos nossos vizinhos castelhanos, que falam mesmo assim? Ou mais remotamente nos nossos aliados da Velha Albion, para quem a forma está, na verdade, correta? 

- E o vaso? - Estava curioso com aquilo do vaso. Fico descansado ao notar que já é o JJ que me responde:

- Se tu partes o vaso, tu ficas sem sobremesa. Tens que arranjar soluções, colas o vaso, compras um novo na loja do senhor Ibrahim, dizes que não foste tu, qualquer coisa... Onde estava o vaso há cinco anos? Quanto vale o vaso hoje? Foste tu que descobriste o vaso e o ensinaste, a sobremesa tem que ser tua!

- Eu?! Mas eu nem tenho um vaso.

- Não! Tu que é Eu. Ou Nós. Quer que chame o Mourinho para traduzir? Ou o Freitas Lobo... - Diz a Edite de dentro do Jorge.

- Não Edite, deixa lá isso. Tenho que ir apanhar o metro.- E vou já em passo apressado na direção da estação. Só que a estação está fechada, por motivos de greve. 

A Ana Avoila está acorrentada à grade. Jornalistas empunham microfones e gravadores fustigados por perdigotos de milhares de entrevistados. Ana grita no seu tom profundamente irritante:

- ...Por isso fica desde já assente que os Sindicatos não voltarão a convocar greves à sexta e à segunda-feira. Isto desde que este governo fascista, imperialista, colonialista, decrete o fim de semana de três dias. - No meio da turba uma voz destaca-se:

- Apoiada! Apoiada! E a criação imediata da carreira de sindicalista. É preciso pôr fim a esta vergonha!

- Sim, isso também. Bem visto Arménio!

A mulher ao meu lado está colada a mim, nua. Ninguém parece estranhar, nem eu. Faz-me festas no pouco cabelo e diz-me baixinho:

- Qual vaso, homem? Está tudo bem, shhh...

Acordo para o meu mar de lenços ranhosos. É quase de dia, é já segunda-feira e há greve do metro. Escondo-me no abraço, fungo mais duas vezes e faço uma nota mental: não voltar a tomar Zyrtec antes de dormir!

quinta-feira, 12 de março de 2015

Herr Heimer, Alz coleciona outra alma.



Ele entrou um pouco menos curvado do que me lembrava, mas muito mais negro de roupa. Os olhos vivos, a mão esticada num gesto que parecia mecânico, recentemente aprendido. Tomei-lhe a mão entre as minhas. Disse-lhe:

- Sinto muito.

Ele sorriu um "eu sei que sim" e não se apressou a tirar a mão. Deixou o olhar endurecer um pouco e falou-me com a liberdade que temos quando falamos com um quase estranho:

- Eu também. Sinto muita tristeza, já alguma saudade, muita confusão e um grande alivio que me enche de vergonha...

- Compreendo, mas não tem que se envergonhar. Acho até que devia ter-se em boa conta por tudo o que fez, pelo cuidado que sempre teve, pelas toneladas de carinho que espalhou por estas mesas. Eu vi. - Não me lembrei de mais nenhum lugar comum reconfortante.

Ele deixou-se minguar um pouco, o peso da eternidade sobre os ombros ou a vergonha de encontrar um lado bom na dor. Guardou as mãos nos bolsos e continuou:

- Não me lembro disso. Só lembro das palavras ásperas quando a paciência me falhou, dos gestos bruscos que assustavam, das lágrimas que me escorreram e da raiva que a indiferença a elas me provocou. O tempo tratará de me devolver o resto, espero.

- Sinto muito. - Repito.

- Obrigado Silva. Digamos que desta vez se fundiu mesmo.

domingo, 8 de março de 2015

Hodor!


Um copo de tinto do pipo para ele, um copo de tinto do pipo para mim...

- Eu não gosto do treinador e não vou gostar. Não é por termos ganho meia dúzia de jogos, nem pó. Quer dizer, ou ele não sabia o que andava a fazer ou os jogadores não lhe ligavam nenhuma até agora. Seja como for, mau treinador. E não sou eu que digo, quem sou eu? Olha, por exemplo, um grande portista, o melhor dos que vi jogar com a nossa camisola, diz o mesmo. Ou achas que sabes mais de bola que o Oliveira? Ou que quase todos os comentadores que andam por aí? Já sei, já sei, não ouves, não vês, andas enfiado num ecrã a ler coisas que meia dúzia de tipos escrevem uns para os outros, tu incluído. Eu, pelo contrário, estou de olhos bem abertos e ouvidos atentos. E é como te digo, muita bola cá atrás não interessa nada. O Jorge Jesus com aquela equipa já tinha uns 20 pontos de avanço. Olha bem o que nos fez no Dragão com um bando de coxos, que é o que o homem tem. Já nós, foram milhões e milhões e milhões. Para quê, Silva? Para isto? Não sou eu que digo, são os que percebem disto, os que sabem como são as coisas. EU sou humilde, ao contrário de ti meu caro amigo, e faço fé no que opinam os profissionais. E não estou a falar de lampiões. Ou achas que o Baia é lampião? Não te acanhes, podes falar, que tens tu a dizer?

Um golo final, o fundo do copo faz aquele som reconfortante no balcão que antecede qualquer "aahh!" que se preze. Mas nenhum som de particular satisfação. Penso: o que me sobra desta conversa ao fim de todos estes meses? Nada, tudo dito. Respondo:

- Hodor! 

terça-feira, 3 de março de 2015

Lapsu conscientia


- Cumcaneco! Partiste a cabeça?!

"...Ela rebolou ágil do meu peito e esticou a mão para a mesinha de cabeceira. Enquanto abria a gaveta, senti-lhe a pele das coxas entrelaçadas na minha perna. Fez um estalo desiludido com a boca e acrescentou:

- Bolas, não estão aqui. 

De um salto estava de pé, nua, fora da cama, de frente para mim. Devo ter salivado com os olhos, pelo sorriso dela e pela forma como pôs o pé no colchão, a torturar. Correu em pulinhos, o rabo a marcar o ritmo do meu olhar, até à cómoda e anunciou:

- Não tenho cigarros! E preciso de um. Este é daqueles que não se deixam. - Deve ter olhado para mim, fixo nos seios, porque elevou ligeiramente a voz. - Hey, alô?! Posso roubar-te um?

Deslizei mamilos acima, pescoço, até poder articular palavras nos seus olhos.

- Sim, claro. No casaco... - No segundo seguinte ela já tinha desaparecido e a minha mente fez "catrapum"! One fucking second too late!

Regressou na segunda perna para dentro dos boxers, pálida, com a aliança entre o polegar e o indicador da mão direita. Nenhum cigarro.

- Tu és casado? - E exibiu o anel, um braço esticado à frente do nariz. Repetiu, enquanto se lhe incendiavam as ventas. - Tu és casado e não me disseste?!

- Quê? - Ganhar segundos inúteis, por mero instinto. 

(Não te rias, tasqueiro dum cabrão. Não te rias...)

- Foda-se pa, tu és casado, meu grande filho da... - Tomar rapidamente o controlo da conversa, impunha-se.

- Hey, calma. Sou casado sim. Nunca tinhas perguntado, não tive consciência que fosse importante, necessário, uma coisa determinante pelos vistos. - Upa, segunda manga da camisa, os olhos à procura das calças.

- A sério??!! - Era um grito cheio de pontos de exclamação, não estou a exagerar. - Não tinhas consciência? Não te lembraste, vá. Enfiaste-te na minha cama e nas minhas cuecas, mas não te passou por essa cabeça de atrasado mental que devesses referir, en passant, que és casado! Já pela outra cabeça pensas tu lindamente, cabrão de merda! - O tom ia variando entre a ironia irada e a fúria irónica, mas o volume parecia sempre aumentar.

- Estou-te a dizer que não tive noção, porra! Não estou a inventar nenhuma história, pois não? Estou a dizer-te que sim, sem tretas.

- Agora!! Um bocado tarde, não te parece? - Devia ter reparado como a mão dela se fechava em volta do cinzeiro, mas o cinto era a minha prioridade.

- Sim, ok, tarde. Mas está pago, não é como se estas coisas prescrevessem...
- Acho que foi por alturas da última sílaba que me acertou.

(Tem cá uma piada! És um santinho tu, foda-se!) "

- Pronto, coitadinho, fez dói dói. Deixa lá ver a marca. - Sei que estou prestes a explodir numa gargalhada plena de recriminação e de um transatlântico de bem-feitos.

- Vai à merda pa! Quais marca, quais carapuça. - Inspirou, repousou o orgulho macho, semi sorriu até. - Vista Alegre. Devia ser Vista Alegre...

domingo, 1 de março de 2015

COMO?




Como não dizer "eu sabia"?

Como é que alguns dos "nossos" vão dizer que o Tello não é o Licá?

Como é que vão "bater" no Casemiro?

Como é que o Jackson joga em Portugal?

Como é que dirão que sempre defenderam o Lopetegui?

Como é que o Cedric acaba o jogo?

Como é que se ganha 3-0 com esta arbitragem? Ou como se tapa os olhos?

Como explicar que conseguimos fazer, e já fizemos, ainda bem melhor que isto?

Como é que vão tornar o grande, enorme, fantástico, S. Calimero de Portugal de quinta numa equipa fraquinha que levava 10 a 0 do Moreirense?

Como se transforma esta vitória num treino contra uns tipos cansados?

Como é que se engole um sapo? E um dragão de komodo?

Como?

Não, estou cheio! 

Mas contente por ter podido partilhar esta mesa farta com os vestem as minhas cores. Mesmo com aqueles, de entre estes, que vão ter que responder, como os lampiões e demais vendidos, a esta pergunta simples: Como? 

PS. Que la sigan chupando.

PS2. Passa por cá para tomar um 3 Marias Bruninho. Quê? Vais mudar de marca?