domingo, 26 de março de 2017

Resumo da semana: In memoriam

Joaquim Ferreira dos Santos. Ninguém se lembra do gajo...

Passado tempo, é difícil que as memórias sejam espelhos da realidade. Provavelmente, serão meras construções do cérebro. Não que sejam mentira, mas são edifícios de lego, compostos de blocos que são, cada um, memórias também. Ou seja, aquela grande imagem que guardamos, é talvez o composto de vários fragmentos que, tendo acontecido cada um, não ocorreram ao mesmo tempo e nem no local em que hoje os recordamos. Será porventura o nosso modo de poupar espaço de armazenamento, condensando num único acontecimento os momentos relevantes de vários. Não sei.

Sei é que muito dificilmente terá acontecido ele estar sentado à cabeceira da mesa grande da sala, muito bem penteado, nas costas a janela - ou seria a porta para a varanda? - à frente, aberto sobre o tampo, o jornal. E eu sentado à esquerda, a cadeira entalada entre a mesa e a cristaleira, acabado de chegar.

É evidente que não podia ser na cozinha, pois que somos homens e a cozinha é o espaço das mulheres. Pode-se por lá passar, se está Sol e vamos para o terraço; ou se deu uma vontade de fatia de queijo e se demoram a trazê-la; no limite, se há uma confusão de cachopas e é preciso pôr ordem na casa.

Com um sorriso cúmplice, ele dirá suficientemente alto, para que se oiça lá dentro:

- Quer tomar alguma coisa?

E eu responderei ainda mais alto, para que dúvidas não restem:

- Pois claro que não, bem sabe que não bebo sozinho. Já se o meu amigo me acompanhasse...

Depois, ouvimos complacentes o ralhete costumeiro. Umas vezes zangado, outras mais divertido que aperreado, sempre consciente do desfecho do caso: Dois copos e uma garrafa sobre a mesa. Não sei porquê, mas estou capaz de apostar que é água-ardente. E pronto, estamos preparados para saber do Mundo.

Anos mais tarde, olhando a família abraçada, de olhos postos na cova, noto claramente a falta de um. Estão incompletos e assim permanecerão. Acabarão por aprender a viver à volta de, apesar do, com esse espaço vazio. Que, desgraçadamente, não se preencherá.

Espero que a Morte que lhe habitou alguma parede do quarto, tenha tido a decência de lhe declamar um poema. E de lhe dizer, piscando o olho enquanto lhe estendia a mão fria:

- Vamos nus?

Vamos nus, ´vô Xico, ver o que andam as pessoas a fazer.

...

Em Londres, atentou-se. Como sempre, o circo mediático parecia estar montado, escondido em algum banco de areia do Tamisa, tão pouco tempo demorou a ser instalado em Westminster. E os dias seguintes foram mais do mesmo, na busca incessante de dar aos voyeurs a pornografia que, na verdade, importa.

Igualmente arrepiante, é a velocidade a que os comentadores e analistas que o Mundo inteiro consagrou, debitam as suas opiniões finais e finalizantes. Assunto encerrado. Bem como os discursos normalizados dos políticos, que antes de abrirem a boca já todos sabemos o que dirão. E acenamos, combalidos pela dor de mais um ataque, solenemente as cabeças.

Por detrás de tudo isto, esconde-se o facto insofismável: Cinco vitimas mortais, provocadas por um tolinho que pegou num camião e numa faca de cozinha para matar pessoas. Já oiço vestes que se rasgam, na perspetiva de que o tolo do Silva esteja a desvalorizar o caso.

Pois não está, está só a recusar-se a embarcar, de olhos e ouvidos tapados, na lenga-lenga decorada pela maralha. Convenhamos que cinco são menos do que cinquenta e dois. O que eu vos digo, é que há muito quem vos tente - nos tente - vender o lado negro, apenas. Uns, porque sabem que é esse que querem comprar; outros, porque sabem que é só desse que podem viver. Eu proponho uma alternativa:

O discurso do Medo diz que o terrorismo pobre é a nova catastrófica moda. Uma chatice bestial, porque é difícil de detetar, porque mete medo à vizinhança, porque é fácil de implementar. E eu acho que isto é uma bela construção que permite manter uma série de malta a mamar nas tetas em que anda a mamar ao tempo. Sob o beneplácito dos políticos - dos atacados e dos atacantes - a quem dá um imenso jeito fazer declarações consternadas e apresentarem-se como os paizinhos que tomarão conta de nós. Ou que nos matarão, tomando conta dos deles.

Porque é que ainda não ouvi ninguém dar os parabéns ás forças que combatem o terrorismo, pelo excelente trabalho que, pelos vistos, têm feito? É que, aparentemente, está bem mais complicado os terroristas terem acesso aos materiais necessários para produzirem as bombas que matam aos milhares. Ou têm menos dinheiro para as comprar. Parabéns às autoridades que têm impedido que aviões sejam desviados contra edifícios. No meio de muito disparate securitário, há - certamente! - espetaculares resultados. Irrita-me que os transformem na nova ameaça, no mais recente fim do Mundo em cuecas. Aiai, agora é que é.

Pá, viver com tolinhos é uma coisa que fazemos desde sempre. Olha, em Barcelos houve um atentado. E o terrorista de Aguiar da Beira também ia a caminho de um número simpático. O que peço é apenas que pensem. A mim, parece-me que somos nós que deixamos os tolinhos cantarem vitória, quando estão, na verdade, mais perto das cordas.

Já estiveram mais longe de serem uma má recordação. Prefiro que estejam mais perto de serem internados no Conde Ferreira, do que de rebentarem uma estação de comboios.

...

Por falar em Conde Ferreira, a Holanda reparou a tempo num doente que se tinha escapado do Conde lá da terra.

Não deixa de ser engraçado ver a esquerda proletária a aplaudir vitórias da direita conservadora, mas o mais importante é manter estes trastes fora do poder. O problema é que há muito que não estavam tão perto e, um dia destes, arriscamo-nos a que a Democracia seja uma memória.

...

Agora, não valia era a pena revelarem-se os tolinhos Holandeses todos ao mesmo tempo, credo. Então, a malta do Sul é mais putas e vinho verde, hein? À conta do Norte trabalhador. Não sei o que isto me lembra, mas...

Pá, que dizer a isto, senão...sim?! Sim, oh doidinho de tamancas, sim! Produzimos um verde de estalo, que fazemos questão de provar basto, não vá passar algum lote de pior qualidade. Aliás, se o comprares ao preço certo, comprometemo-nos a produzir o melhor verde do Mundo. O único, a bem dizer. Para teu deleite. Mas nosso também, em antes de ti.

Quanto ao resto, no worries chefe. Manda as tuas protestantes frias cá para as terras do sangue quente. Prometemos que as devolvemos frescas, mas conscientes da sua sexualidade; intactas, mas libertas de puritanismos hipócritas; livres, mas exigentes ao nível do desempenho dos seus parceiros de cama. Ou de chão. Ou de banca da cozinha, atrás dos arbustos, na praia e no wc da disconight. O que pode ser um problema para ti, está claro. É por isso que achas que só em pagando é que lhes podes chegar. They know better, mate.

Se pagares o valor justo, mandamos-te um TIR de Zézés Camarinha para darem formação por essas bandas. 

Esta gente perdeu a memória da Flandres muito depressa. É capaz de estar na hora de os lembrar das bases do mercantilismo: Nós temos. Se tu queres, paga. Se não queres pagar, ao menos esconde a inveja.

...

Mas a beleza de tudo, é que os loucos ainda são uma minoria. Não devem ser desprezados, nem subestimados, como bem sabemos. No entanto, é refrescante perceber, na maior parte do tempo - que não no tempo todo! - que mesmo os estúpidos mantêm alguma memória dos benefícios da sanidade.

...

- Oh Pedro. - Olhos postos na parte rosada da grande janela.

- Sim, Senhor.

- Achas que eu sou um gajo? Sinceramente, parece-me que perdi a memória do género. Vai-se a ver, sou Holandês... - Preocupado.

- Creio que sim, Senhor. Se tivesse que arriscar, diria que É mesmo um gajo.- Seguro.

- Então, até logo. - De saída.

- Hã? Onde Vai, Senhor?

- Fazer uma visitinha à Rita...

...

Soundtrack to memory: I can smile at the old days.

8 comentários:

  1. O putin está com cara de quem acabou de ser consolado. E bem consolado, ao ponto de nem se importar de ficar baixinho na foto! E a le pen também não engana, aquela cara diz tudo, acabou de o consolar, gostou e sente-se boa no que faz! No mínimo, paira ali sobre a cabeça de putin a dúvida, serão as russas as melhores pecadoras públicas?

    Faz lembrar o clube do regime e as instituições que o consolam de joelhos! De tão consolados que são, não se importam de ser a figura baixinha da foto, e os que o consolam, têm uma garganta funda que nunca mais acaba... para eles isto é Democracia! Serem servidos!

    Abraço

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    1. É por isso que eu sou um grande Democrata! LOL
      É assim mesmo, grande Carrela! No rest for the wicked!
      Abraço.

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  2. Libertar as vaquinhas holandesas de puritanismo?

    Hum... mais fácil seria libertar o estado lampiânico de honestidade intelectual...

    como é, vamojáluz?

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    1. Acho que os lampiânicos estão livres de toda e qualquer honestidade. Sobretudo, intelectual. Era ao contrário, não? :)
      Quanto às Holandesas...qui nada carai, vintjianodjipraia... :)
      Nop, não entro naquilo. Tenho medo que caia. Para além de que cheira mal. E é feio.

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    2. Foi a seguir ao almoço. Mas ainda assim, a ideia é que as holandesas têm tanto puritanismo como o EL tem honestidade intelectual. Makes sense?

      Chicken shait

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    3. Verdade, abençoadas! Foi a bem da tese, deu jeito. Yep, faz sentido.
      🐓 :)

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  3. R.I.P. Vô Xico. :(

    P.S. Continua a espantar-me essa capacidade de tudo SER bola! Mas também acho que nunca vou entender. :D

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    1. Nenhuma bola no post! Até eu fiquei espantado quando li. Sacana do Silva :)

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