De férias, é assim que estamos, colecionando momentos irrepetíveis, como se houvesse momentos de outro género, como se fosse possível regressar, repetir, copiar.
Como bem sabes - uma mesa num café anónimo, no tempo em que todas eram de fumadores, uma espreguiçadeira à beira de uma piscina de cloro, tu deitada, eu sentado aos pés - não consigo evitar esta coisa de colocar os ausentes nos locais de agora. Se calhar é só uma forma de lhes dar férias, de os tirar dos ombros enquanto salto para a água, eu mais leve, eles livres deste jugo que lhes imponho. A Ti não, que ainda não me parece que tenha aceite completamente que Vives em mim. Apenas.
Deixemos isto, convenientemente, por discutir e resignemo-nos ao facto, de qualquer forma insofismável, de caminhares ao meu lado. Por agora basta-me e Tu não tens como protestar.
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Sabe-se lá como, vim dar a sítios de churrasco nas margens, minis em punho e cigarros a queimar no fio perdido das conversas, enquanto as brasas pegam. Fomos passando, eu e Tu, por estes locais, trocando olhares cúmplices, até termos desaguado nesta esplanada sobre um rio. A sombra dos guarda-sóis vermelhos espalha-se por uma área apreciável, deixando uma mesa perdida no extremo. Ao Sol. A nossa, certamente.
Aquela em que as tuas gargalhadas parvas se entrecortariam com os acessos de tosse que prenunciam a Morte. Estaríamos praticamente deitados nas cadeiras, a torrar, desfiando um rosário de maledicência e piadas estúpidas. Os dois - ah não, os três! - plenos de Presente, ignorando com a maior naturalidade a Vida, essa coisa que correria em paralelo a uma Felicidade de momento. Lá longe, nas partes incertas onde as pessoas sobrevivem. Até que fosse segunda-feira e nos viessem agarrar pelo pescoço e esbofetear-nos com lambadas de realidade. À bruta. E saberíamos então que a culpa era completamente nossa. Como a mesa ao Sol, esquecida pelo resto da esplanada.
Na relva da margem, repousaria a enorme geleira. Façamos um breve inventário: uma bola de queijo flamengo, 350g de fiambre, um chouriço, quatro pacotes gigantes de batata frita, 20 ou 25 latas de cerveja, gelo, duas garrafas tamanho familiar de Coca-Cola, quantidade indeterminada de papos-secos, abre garrafas, uma faca de cozinha, um pacote de manteiga, um melão e uma melancia.
É certo que se entregar esta lista a qualquer um dos outros, ela crescerá, até se tornar uma geleira imensamente impossível, daquelas que podem carregar toda a Alegria do Mundo. Nenhum de nós pode ter a certeza se existia ou se foi um épico sonho coletivo.
De pernas cruzadas à chinês, preparas em facadas certeiras as nossas sandes de queijo, com manteiga e batata frita. Os miúdos correm soltos e felizes, mergulhando no Mar da nossa inconsciência, e vêm à chamada da fome. Comem em pé, a pingar água, e sorriem. E depois riem. Porque por qualquer estranho motivo parece que não aprenderam outra coisa. E a gente aperta o pão e ouve as batatas a estalarem lá dentro e antecipa a mistura das gorduras e do sal, a maciez do flamengo e o crocante das batatas e depois o gás do malte ou do caramelo dispara uma bolha para o nariz e os portões do Paraíso abrem-se de par em par.
Os bebés espalham-se pelos seus vários pontos cardeais e nós retomamos o caminho da esplanada ou da sesta ou da geleira. Quando nos cruzarmos, alguém os empurrará para a água e depois saltaremos todos e as pessoas vão ficar a olhar. Como se o Mundo não acabasse depois do jantar.
A quantidade de escolhas racionais e partidos ponderados que estas coisas que não sei dizer me impediram de fazer e tomar, é algo que já tentei explicar milhares de vezes. Sem sucesso. Nunca passei de está perdoada à partida e serei sempre eu a dever no fim.
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Às vezes ainda caio na esparrela de me pôr a pensar que podíamos, os que vamos sobrando, repetir, em conjunto ou cada um com os seus, estas jornadas de “vamos ao Algarve amanhã, mas acordou mau tempo e vamos em direção à Serra da Estrela, mas só até à Mealhada”. Porque é hoje. Pouco importa que tempo fará amanhã.
Mas sabes, não podemos. Continuamos a ter, descansa, parvoíce que sobeje para as gargalhadas. Temos bebés em número muito razoável e até, ou mais que tudo, a Tua Memória religiosamente preservada. Somos é outros, em outro tempo, transportando outras vidas. E não me passaria pela cabeça empurrar qualquer das crianças para dentro de água. Só os pais delas. As mães, para ser completamente exato.
Eu podia só dar-Te a mão e levar-Te a passear, porque a vista é bonita e o ar agradável. Deixar-me ficar calado, em vez de Te maçar ainda uma milionésima décima vez com a mesma história. Mas depois ia contá-la a quem? Não sei, a todos, talvez? Um dia ainda encontro a resposta para isto. Mas hey, nós vamos falando. Até já.
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Por entre zaps de moscas fulminadas e delirios de medronhos virtuais o holograma do tasqueiro assombra-me a niilidade....ecos de Pessoa arranham-me o espirito e percebo...perdi todo o contacto com o mistério que a realidade vela para só sentir a inquietação que a ofusca.
ResponderEliminarUm abraço.
É o desassossego. Ou o ópio, um deles.
EliminarAbraço e obrigado pela companhia.
Às vezes sinto que és um bocadinho a minha "Mana" e eu o teu "P.inho". Talvez porque queira muito ou talvez porque inveje essa coisa que não se explica.
ResponderEliminarQue me sinto sempre devedora para contigo, é um facto. Porquê? Por tudo e por nada.
É esta coisa que não se explica e este novo eu que parece não saber aprender a viver esta nova Vida.
Sinto-me sempre tão melhor e tão mais próxima quando te leio...
Mas olha, há uma piscina por perto e pessoas para empurrar ;)
Love you*
Credo, nem penses! Não aspirina tanto e tu és demasiado bonita para a comparação. Deves-me 5€, isso é verdade. E eu outros 5 a ti ;)
EliminarNada de confusões, continuarão a ser empurrados, mas esse é o ponto: seremos todos outros. Melhores até do que aqueles q fomos, mas outros. Por isso estamos autorizados à saudade.
Love you back.
Lolol “não aspirina”??? Não aspiro a, assim é q é. Mas tem menos graça :)
EliminarIdem por aqui: com a sensação devedora.
ResponderEliminarQue sempre foi um bocadinho minha mas que agora parece que machuca um bocadinho. Agora pesa mais. Ou sou eu que trago mais peso, não sei. (emocionalmente falando, zero piadas acerca da celulite do meu rabo, ok?!) :)
Mas acho que é isso: permitirmo-nos a viver a saudade/tristeza é como abrir uma caixinha de Pandora. Nunca sabemos se vai sair de lá, um sorriso nostálgico e tranquilo ou uma dor das que corta.
Nunca sabemos.
Há dias em que - para mim - a saudade vem em sustos. De repente, lembro-me. Mesmo como um susto. Aquela mini dor que temos no peito quando alguém se esconde numa esquina e nos grita "ahhh" e nós devolvemos um "ahhh" igual, mas entre os dois gritos há um choque eléctrico no peito, sabem? Aquele mini ataque cardíaco? É a saudade, para mim. Só que dura bem mais do que aquele micro segundo. Há dias que vem em sustos e fica a dor, como se estivesse sempre assustada.
Mas, ainda assim, é bom abrirmos as caixinhas todas. Uma a uma.
E é bom (re)vivermos estas memórias.
E sim, ler-te também me ajuda. #sempressão
Quanto a aprendermos a viver esta nova vida... cada um no seu ritmo, cada um com a sua "estratégia", cada um com a sua dor, vamos levando. Sem certos nem errados,
Vale tudo, menos empurrar para a água. :)
Beijinhos aos dois,
Love you (ligeiramente menos)
Raka
E a vida não é mesmo uma sucessão de mini sustos? Uns são “bons”, outros trazem-nos tristezas e dores. E eu cá não tenho nenhum plano de abertura de caixas, é provável que algumas permaneçam para sempre fechadas. Ou não. Mas hey, nós vamos falando ;)
EliminarLuv you back
<3
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ResponderEliminar❤️
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