segunda-feira, 30 de janeiro de 2017

Geometria para adeptos simples



- Vá lá, vá lá, todos sentados. - Espera que a rebaldaria acalme e que todos tomem os seus lugares.

Agora já lhe é mais fácil resistir à tentação de se sentar no meio deles, os pés descalços em cima das botas. Mais um, mas não apenas outro. Um dos respeitados, por antiguidade e espírito. Fecha-se a porta da sala:

 - Então, então, silêncio! - A vara a bater no quadro branco. Escoam as últimas risadas, ouve-se ainda uma cachaçada. - Vamos lá prosseguir na matéria, que estamos quase nas provas finais e quero-vos como o aço.

Ajeita os óculos. Desenha um polígono. Encara de novo a turma:

 - Ok, meninos, e então? Que figura geométrica é esta?

Escassos segundos de silêncio são quebrados, como que por magia, pelas sílabas do primeiro a atrever-se: É um triângulo!

Abrem-se as comportas, rebenta-se o dique, rompe-se o hímen. Ainda que, espantosamente, mantendo alguma ordem, todos arriscam a sua sorte: É um pentágono. Um círculo é que não é! É um hexágono. Um octógono, é um octógono, prof.

Ele sorri perante a diligência, gosta daquela fome de acertar. Mesmo quando posto perante tanto falhanço. Volta a bater com o ponteiro no quadro, impondo a palavra:

- Ora, um octógono seria estúpido. Sem o Evandro e o Sérgio, não conseguimos fazer um octógono, já se sabe. Havíamos de ter tentado em antes de serem transferidos. Agora não vale a pena pensar nisso, paciência. E ainda ninguém acertou...

A maralha retoma a sua alegre cantoria: É um quadrado. É um trapézio. É um heptágono. É o losango de São Bento. É o Super-Homem!

Rebenta a sala numa gargalhada a plenos pulmões.

Ele enrubesce. Não grita, espera que o barulho cesse pelo seu olhar recriminador. Os risos diminuem, sendo substituídos por leves pigarreares, pequenas tosses comprometidas, olhos no chão. Nos pés descalços sobre as botas enlameadas. Sem alterar o tom:

- Quem foi o engraçadinho?

Silêncio. Olhos na parede, na janela, nos blocos de apontamentos, no ar.

- Como é? O piadista não é homenzinho para se acusar?

Silêncio. O grupo fechado, uno na defesa de um dos seus.

- Ok, muito bem. Admiro esse espírito de corpo, mas como calculam, isto não pode passar em branco. Que não saibam a vossa geometria, vá. Que alguns ainda confundam polígonos com poliedros, vá. Agora, piadinhas parvas, isso não. Pela última vez, quem foi? - Silêncio.

Ele deixa prolongar a angústia, fazendo uma pausa para limpar os óculos. Determina:

- Assim sendo... - Põe os óculos. Não eleva o tom. - Diogo, para a rua!

Enquanto o cachopo arruma as suas tralhas, muito vermelho da injustiça, o professor acrescenta:

- Oliver, vais com ele para não te estares para aí a rir...

...

Eu sou um simples adepto, pouco percebo de futebol.
Eu sou um simples adepto, pouco percebo de futebol.
Eu sou um simples adepto, pouco percebo de futebol.
Eu sou um simples adepto, pouco percebo de futebol.
Eu sou um simples adepto, pouco percebo de futebol.

Já na Geometria, sou um craque!

Next please!

De preferência, sem nenhuma genialidade. Só uma coisa simplezinha, corriqueira, vulgar de Lineu. Pode ser, senhor Professor? Agradecidos.

...

Soundtrack to Mr. teacher: Funny creatures...


sexta-feira, 27 de janeiro de 2017

A nubente e o bicho papão

Oh mãe, oh mãe, o senhor esquisito está a dobrar o mano num tronco...

Houve uma altura feliz - a Vida está cheia delas - em que dividi com mais dois maluquinhos a nobre tarefa de ver todos os filmes que pudéssemos. Dos clássicos a futuras obras de culto, passando por blockbusters e coisas de que nunca ouvíramos falar. Tipo tarados sexuais: Papávamos tudo o que apanhávamos.

Era o tempo do VHS. O nosso crítico de cinema preferido chamava-se Sinopse e vinha escarrapachado nas costas da cassete. O nosso género favorito era o terror, o que quer dizer que podíamos muito bem passar 12 horas a ver fitas do Carpenter ou o Shining em loop. E tudo, mas tudo, o que nos aparecesse com ar de série Z.

É por isso que devemos ser, que ainda Somos os três, os únicos habitantes do Planeta que sabem que os piores filmes da História do cinema se chamam Bridge to nowhere e Zero boys. Adorámos, adoramos e adoraremos. E também aconselhamos, está claro.

Todo o terror tem um papão, um boogey man. Daqueles ali em cima, às obras primas. É o tipo que mete medo. Já se sabe que é filme, pelo que um puto parvo a viver os últimos anos de teen nunca chega a ter pavor de porra nenhuma. Depois amadurece, aprende que o bicho papão é, as mais das vezes, ele próprio e ri-se da recordação de um ou outro arrepio. Noite escura e ninguém na rua e era preciso subi-la inteira.

A menos que seja a Mama a descer as escadas da garagem, a fazer a ponte; ou que alguém diga, por perfeita idiotice, Babadook. Três vezes seguidas. Aí, não acho graça nenhuma, dass. Até evito ir fumar cigarros para a cave, se me lembro. Não é medo, é respeito. Agora medo, pfff, de filmes, pfff, poupem-me, pfff.

...

Lembrei-me, porque reparo que vivemos o Tempo do Bicho Papão. Sim, esse também, mas era na bola que estava a pensar - sorry love.

- Estamos bem arranjados, estamos. Esta segunda volta é de fugir todo borrado...

E pronto, fico a pensar que, na segunda metade do campeonato, vamos ter que ir jogar contra as equipas apuradas para os oitavos da Champions. Afinal, diz que não. É com as mesmas contra quem jogámos na primeira volta. Não percebo onde está o bicho papão.

- Porque és tapado de todo. Vamos a Carnide, a Braga, a Chaves, ao Funchal, a Guimarães...

Ou seja, não vamos ao Campo Grande, nem a Setúbal, nem à Choupana, nem a comprar móveis a Paços, nem ao outlet a Vila do Conde. Yep, do ponto de vista do shopper, a coisa está negra, de facto.

O que não podemos é jogar como na semana passada. O que temos é que fazer a nossa parte, esperar que a inclinação dos campos seja menos acentuada e manter a alma. Sendo que estamos fartos de jogar a primeira parte do lado de baixo; e a segunda a subir.

O resto, meus caros, é calendário e nós somos o FCP. Não uma nubente acagaçada com o bicho papão. 

Hã? Sei lá, foi só uma imagem...

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- Bah, o Soares, por alguns 70 milhões, um gajo que nem para salvar a vida da nubente é capaz de marcar um golo. Com o CR7 disponível e vamos buscar este coxo! O extremo, que era mesmo o que fazia falta - agora que já não podemos desancar no avançado - nem vê-lo. E se o virmos, não presta, isso é certo. É de fugir.

Nem vale o comentário, é uma atitude auto-explicativa. Só reafirmo que o Soares é na mouche...

Sim, já sei rapazote, não é bom sinal, uma vez que eu percebo mais da influência do raio laser no desbaste pilórico da nubente, do que de bola...

...

- Ahahah, o Assis, esse monstro consagrado, o filho que Patrick Vieira e Guardiola teriam tido, cagou em nós e foi para o Braga. Mas o PdC não percebe que está acabado? É uma alma penada que nos assombra, nada mais.

Para já, não conheço lá muito bem a peça. Mas as opiniões que recolhi, que muito considero, levam-me a crer que era um bom reforço.

Agora, não podemos é andar a dizer que basta de comissões à segunda; e a anunciar o fim do Mundo porque não queremos pagar comissões indevidas, à sexta. Godspeed, oh Assis.

- Siiiiiim, pooooiiiiis claaaaro, nem depende nada de para quem é a comissão nem nada. Oh pessoal, o Silva é uma nubentezinha inocente...

Pimbas, lata de cavala em molho de tomate na cabeça! Ele segura a lata com uma mão e a testa com a outra:

- Foda-se, Silva, isso dói. Ainda por cima, fora do prazo!

- Queixa-te à ASAE. Não tenho medo do papão.

...

- A vergonha, mas mesmo vergonhosa, vai ser a humilhação contra a Juventus. As saudades que eu já tenho do meu alegre ano de 1984...

No qual a ultima coisa que se esperava era que o FCP estivesse em Basileia, naquela final, contra o colosso de Turim. E tivesse que ser gamado à má fila para perder.

Eu não tenho medo de Romanos. Até porque são loucos. E estes, nem Romanos a sério são, que a esses já os despachámos. O nosso P é de Porto, não de peru. Não morremos de véspera.

Raios, se não parecem nubentes anelantes, na ânsia da defloração: Vai correr mal, vai doer, não sei fazer, melhor será lavar-me por baixo outra vez...

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- É tudo muito lindo, mas o que me aterroriza é que pode bem acabar já amanhã. Sabes que a maldição da Amoreira...

Portanto, aqueles tipos que levam na pá há 6 jogos consecutivos. Sim senhor, estou petrificado. 

Já agora, podemos vir a jogar numa piscina de luta de nubentes na lama. O que também não mete medo nenhum, tendo em conta a nossa forma favorita de sair para o ataque - cuja banda sonora é: PUM! - e um certo Belga, que ainda vai dar muito jeito. É sempre útil ter um Jason pronto a usar.

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Em resumo, se estão com medo, comprem um cão. Olha, o dos Baskerville, por exemplo. Um doce de cachorro.

Agora vou bazar de fininho, que o anormal do Berto disse Babadook duas vezes. E vai repetir. Credo!

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- Bicho Papão?! O Bicho Papão é o Moreirense! - Avia de um trago o double scotch, no rocks.

- Ah, Pedrito, nem reparei que estavas aí. Deixa lá isso, pá. Pensa em coisas positivas. - Consolo-o - Olha, por exemplo, estás com uns dentes espetaculares...

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Soundtrack to (no) fear: Come boogie with the boogeyman...


terça-feira, 24 de janeiro de 2017

A Mesa do Canto: O velho Senhor Lima (com Miguel Lima)



Há dias em que nem me lembro se o vi. Oh, está bem, tem dias em que nem penso se o vi ou não. Tudo o que importa é acabar a limpeza, guardar o que for de guardar, para que não se estrague, enrolar o cachecol à volta do pescoço ou atirar um casaco leve para trás das costas e correr para casa.

Mas é certo que ele cá esteve. Perdido em risadas e a perder no dominó belga, no meio dos velhos; a trocar canções e lições, na mesa dos putos; a discutir a bola ao balcão, com os maduros; a tirar os seus próprios finos, se me vê atrapalhado com a cozinha, dos quais mantém uma contabilidade tão rigorosa que acaba por pagar sempre um a mais. Pela ousadia, Silva.

Miro-o daqui, de longe, fundido na paisagem da Tasca, integrado neste cenário que já nem eu sei se é mesmo imaginário. É o Original. O Primeiro. O Antigo. Aquele que meteu o nariz e entrou mesmo. E ficou. É mobília. Da que se trata e restaura e nunca se vende.

Olho-o sempre com a ternura que se deve a quem não abandona. Aos que fazem da nossa casa a sua casa, não por abuso, mas por genuíno prazer. Por bondade, tantas vezes. Está ali, absorto no ecrã do seu espertófone, a deixar correr o fim de tarde, por uma vez sozinho. Na mesa do canto.

Passo por trás e deixo-lhe o calduço da praxe. Provoco-o:

- Então xoné, tens algum pé a gelar? 

- Ambos os dois. - Sorri, sem levantar a cabeça.

- Já não me sento contigo há uns tempos. Como vai isso, meu velho?

- Velho é o senhor seu tio, se não se importa.

- Oh sim, sim, és um mancebo, tu. Era rapares os pelos e vestires uma saia travada e havias de ver a mocetona que davas. 

Passa um puto em direção à saída. Atira-nos um "b'noite, senhores". Digo-lhe:

- Aí tens. Senhores. És o velho Senhor Lima. Deus te guarde.

Pela primeira vez, ele presta-se a olhar para mim. Entre nós, a garrafa de verde Alvarinho que não me lembro de lhe ter servido. Por uma qualquer magia - tão corriqueiras nesta taberna são as coisas fenomenais - oiço-lhe, bem no fundo da minha mente, o pensamento.


... 

diz que sou «velho»...
é capaz de ser verdade, no sentido em que invariavelmente já me tratam por «senhor», bastas vezes e em diferentes situações - e não será pela barba estilo 'taliban' (a minha esposa acha que é mais 'talibom'...), que mantenho desde o último Natal.

diz que sou «velho»...
talvez o seja, para alguém nado na colheita de '75 e aos olhos da juventude de agora. mesmo assim, considero-me um ganapo na flor da idade e apesar de estar a atravessar a fase da Ternura e com uma elegância condor (i.e., amiúde com uma dor aqui, com uma dor acolá).

diz que sou «velho»...
se aqueles «são os trapos», então estamos esclarecidos: não me considero um farrapo, pese embora anseie por ele a seguir à consoada de Natal, no dia 24, para um almoço que se prolonga sempre para lá da hora do jantar. é que ele há velhas tradições que não mudam, e o deleite em degustar um bom de um farrapo velho, pelas Festas, é uma delas.

diz que sou «velho»...
agora que vou pensando nisso, talvez haja um pingo de coerência nessa afirmação. por exemplo: ainda não me acostumei às Novas Tecnologias, às quais sou um velho do Restelo e, a quase todas, céptico por natureza (defeito?). e é assim, nesta velha (gasta?) forma de não me convencer, à partida, pelas novas formalidades plenas de conhecimento técnico e científico, impingidas (sobretudo) por desideratos comerciais, que o esboço das postas de pescada lá do sítio resvalam inevitavelmente para a folha A4 dobrada a meio (velho hábito para ganhar mais proveito na escrita) e para a caneta (obviamente que de cor azul) mais próximas. faço um esforço para escrever directamente naquele quadro em branco, presente numa tela do computador lá de casa - não posso dizer que amiúde também escrevo no trabalho, mesmo que seja nas minhas pausas para almoço, pois não?... pois não. não convém. e até já sou considerado "velho" para procurar um novo e tudo, não é?... pois é... -, mas falta-me aquela "magia" dos meus gatafunhos ganharem vida no velho canhenho de anotações várias, diversas e diversificadas - as quais não giram redonda e redundantemente em torno do mundo do esférico rolando sobre a erva, mas sobretudo neste.

diz que sou «velho»...
porventura já o serei e com a consciência de que frequentemente vou adquirindo tiques próprios dos meus progenitores, quando estes tinham a minha idade e eu era um proveta chavalo, «com borbulhas no rosto» e que adorava ir jogar à bola com os meus Amigos, para o Parque da Cidade, naquele lugar tido como "só nosso" e onde os espectadores dos nossos dotes futebolísticos eram as árvores, espetadas no solo, que o circundavam. agora, tenho o neto deles e dos meus sogros, a recordar-me a felicidade de uma nova etapa na minha vida: a Paternidade - provavelmente um chavão gasto, estafado, velho, mas que renasce todos os dias dentro de mim.

diz que sou «velho»...
quiçá haja uma insuspeita conformidade nessa ideia, bem lá no fundo do meu Ser. e se tal significar que resiliente e resolutamente não renego as minhas origens, que carrego a honra dos nomes das famílias que me trouxeram a este mundo, que não vendo os Valores que me transmitiram "por um prato de lentilhas", e que a Felicidade também se encontra nas coisas mais simples desta vida - como a de uma bola a beijar as redes de uma baliza adversária, e para lá do velho bordão do dinheiro que, por exemplo, dizem possibilitar a compra de um iate novo, carregadinho de meninas noviças, acaso credoras desse brioso epíteto de laborarem numa profissão duvidosa (no sentido em que ninguém duvida de onde vêm, para onde vão e como o farão, não sei se me faço entender?...) -, pois que assim seja!

diz que sou «velho»...
se os seis parágrafos anteriores o indiciarem, então seja: sou velho. mas sou feliz! e de nada me arrependo ao longo destes 41 anos de existência, porque tudo o que fiz foi em consciência - de um «velho» certamente, mas que ainda é muito novo e que tem que comer muita "chichinha" para adquirir o que "os mais velhos" apelidam de Experiência de Vida.


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Ele termina o seu copo. Olha-me de forma estranha.

- Então pá? Estás bem? Fixaste em quê? Estás aí calado há um bom minuto.

- Hã? Nada, desculpa. Acho que me perdi por um momento, Senhor Lima.

Esboça um sorriso franco, mas triste. Como que uma nuvem passageira que tapa o Sol numa tarde de praia. Diz-me:


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- Essa expressão - «senhor Lima» - remete-me invariavelmente para o meu Avô - o meu segundo Pai, mas com uma importância capital para o homem que sou hoje, e do qual tenho muitas saudades. não há dia que passe que não pense nele e nos seus ensinamentos. o maior de todos, foi o de ser Íntegro; o segundo, foi o de me ter incutido o Respeito pelo Outro; o terceiro, foi o de me ter guiado às Antas, pelas suas mãos (calejadas de uma vida de agruras e tormentas), para perceber e apreender a felicidade do Portismo.
e, acredita!, dentro das coisas mais banais da Vida e menos importantes para o seu significado, não há felicidade maior do que o sentir o Futebol Clube do Porto no nosso íntimo. e, claro!, já se sabe que estado de Alma não se explica por palavras, porquanto que estas ficarão sempre aquém do que invariavelmente se sente.

por último e não menos importante: foi graças ao «senhor Lima» e à ventura de me ter conduzido para o Amor incondicional e indefectível à cor azul-e-branca - «indomável, imortal», como reza O poema - que tenho o grato gosto de poder partilhar essa benção com alguns, velhos conhecidos também das andanças da bluegosfera, e contigo,Silva. 

e, agora, se me dás licença, vou ficar aqui, na mesa do canto, a passar a limpo umas linhas (#notmadeinporta18) de pensamentos que estava a ter. Traz-me o velho computador, se não te importas. vai!

Miguel Lima | Tomo III

Este senhor opta por escrever na ortografia antiga. Velho.

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Espero que o Miguel não leve a mal os pequeníssimos ajustes ao seu texto original. Creio que serão quase imperceptíveis ao próprio, tendo servido, exclusivamente, para dar sentido à minha "estória". A itálico, a parte verdadeiramente importante deste texto, o original do velho Senhor Lima. 

O meu agradecimento fica nas linhas que lhe acrescentei. Espero que seja claro e suficiente. Pelo sim, pelo não, OBRIGADO, meu velho.

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Soundtrack to good ol' Mr. Lima: We remember...


sábado, 21 de janeiro de 2017

Milho aos pombos

Calma, malta. É o André André. A gente pode bem com o gajo!

Uma tarde muito intrigante, hoje no Dragão. E também houve um jogo de futebol. Essa parte, despacha-se num instante:

Depois de um quarto de hora de nicles, livre de Alex Telles e, pumbas, golo do Porto. Oh yeah, de bola parada. Seguiu-se mais meia-hora de coisa nenhuma, incluindo uma bola na barra por Jota e um frango bem assadinho pelo Iker. 1-1 ao intervalo.

A segunda parte começou com um penalty limpinho que o árbitro marcou. Contra nós, portanto. Reagimos com nada - se é de futebol que se trata - e choveram dois livres de Alex Telles. Pimbas, golos de Marcano e Danilo. O último nem queria acreditar que, a jogar assim, estávamos à frente do marcador outra vez. Ufa, só faltava meia hora de controlo e saídas a preceito para o contra-ataque e assunto arrumado. 

Assim foi, só que não. Controlamos a correr bastante atrás da bola, mas sem a cheirar muito. Saímos com critério para o ataque, através de belos charutos para onde se estivesse virado. Depois de um calafrio na nossa baliza, o Rui Pedro deu consigo a um metro da linha de golo. Com o guarda-redes na outra ponta. Ora, já se sabe que assim é demasiado fácil, pelo que fez pontaria ao Cássio. E acertou-lhe! Infelizmente não em cheio, de maneira que a bola ressaltou para dentro da baliza. É continuar a tentar. 

Em resumo: Que bela bosta, sim senhor. 

- Oh Silva, pareces o assobiativo! Buuu, buu, que ganhámos katradois? Tás maluco, pá?

O problema, meus caros e pacientes amigos, é que, desta maneira, não vamos ganhar katradois muitas vezes. Quê? Mais vez nenhuma! Quê? Assim, duvido que ganhemos. Ponto.


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Mas isso agora não interessa nada. O que importa mesmo, é que foi uma tarde cheia de coisas muito esquisitas.

Por exemplo, quem é que se lembrou de espalhar milho pelo relvado? Tanto pombo a bicar o solo, credo. Assim, não há relva que resista. Cá pra mim, era para alimentar o frango do Iker. Lá gordinho, estava ele.

A minha calculadora pifou, ao tentar contabilizar o número de posições em que o nosso técnico quis que jogasse o Tsubasa. No meio, mas descaído para a direita, a médio esquerdo, a caminho do banho. Ah bom, estava a ver que desta vez se tinha esquecido. Até se compreende, que o tipo está particularmente mal este ano. Nem consegue fazer os companheiros desmarcarem-se, para ter a quem passar a bola, nem nada. Um fiasco.

Diz que o Herrera deu a cara pelo Porto. Acho que deviam explicar aos cámones que ele já cá chegou com aquelas fuças. Não ficou assim depois. Senão, nunca mais cá poisa gringo nenhum. 

Menos mal para o próprio: Se deu a fronha pelo Porto, agora deve poder escolher outra. Mai'bonita, digo eu. Mas não é obrigatório. Por justiça, diga-se que não esteve pior que o resto. Também, era difícil.

Bonito, bonito, está o André André. Desde que ele entrou até ao fim do jogo, fartei-me de pensar "tá bonito, tá". Depois de assistir ao último golo - na única jogada da equipa depois do trêzadois - um gajo só pode ficar intrigado: Mas porque é que obrigam o Oliver a jogar ali, para o André André moribundar no meio. Sim, o verbo moribundar, de moribundo mesmo.

Mais uma vez, o NES acertou na mouche, na conferência de imprensa: A equipa teve caráter. Vá, até podemos dar de barato a ambição. Pelo menos, a ambição de ganhar um bacalhau, pelo chutão para o ar que vai maijalto. Só falta jogar à bola. Está quase Nuno, está quase.

É aproveitar esta intrigante tarde para melhorar muito. E muito depressa. E não repetir, mesmo que desta vez tenha corrido bem. Muito bem.


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O Grande Vila Pouca perguntou, há poucos dias, no seu soberbo e obrigatório Dragão Até à Morte, se o Soares é fixe. É, sim senhor. Penso eu de que. Marquem bem que leram aqui primeiro. Para o bem e para o mal.

Se o Corona, que fez um jogo tão bom quanto o remate na cara do redes adversário, na primeira ocasião de golo do jogo, encostar por lesão, não há remédio, tem que vir um extremo. Tipo o Kelvin, mas para jogar futebol mesmo. Mas qual Sisto, pá? Deixem-me da mão, chiça.

A propósito de extremo, aquele rapaz que esfrangalhou os nervos ao Layun , é moço para custar muitos dólares? 

Última palavra para o único que esteve ao seu melhor nível: Olarilas Jorge, muito bom. Excelente. É como os pombos, sempre a bicar o milho que lhe deixam, até  ficar de papo cheio. A minha única dúvida, é se é da cor da camisola que usas ou se, simplesmente, és uma bosta tão grande quanto o jogo desta tarde. Vai-se a ver, é as duas. Se o senhor Sousa, seu pai, lhe enfiasse umas valentes lambadas nessa tromba, é que era de serviço.


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Olha, não fosse pelos golos - obrigado Alex! - e pelos centrais, sejamos justos, mais valia ter ido dar milho aos pombos. Espera, tu kéjbêr... 

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Soundtrack to pigeons: Woop woo.

sexta-feira, 20 de janeiro de 2017

Apontamentos práticos para uma atitude zen



Para se atingir o estado zen, tem que se ter método. Não é uma mera decisão da mente, é todo um trabalho continuado. Há passos imprescindíveis.

#1 Manter a rotina

A hora não é determinante, o local pode variar, mas apenas ligeiramente. O importante é manter o hábito, não se desviar da rotina matinal, sob pena de todo o dia vir a parecer um dia de outro individuo qualquer, que não o próprio. Já se sabe que viver os dias dos outros não é boa ideia.

Com o inconsciente a coordenar todas as operações - pois que estes pensamentos não se coadunam com o automatismo da Vida - desliza a longa e estranha gabardina por entre as mesas do café. A mesa é uma das duas de sempre. Não precisa de pedir café, nem o copo de água. Só tem que dizer que tipo de pão lhe devem torrar hoje.

#2 Estabelecer prioridades

Não que o pão ou o café sejam assim tão importantes. Cumprem a sua missão, está claro, mas não seriam decisivos. O que os olhos procuram é o jornal. Aqui está este homem de aspeto um tanto estranho, com a sua gabardina um tanto estranha - embora menos, nestes dias mais frios - a quem servem sem dizer palavra, enquanto roda a cabeça à cata do SEU jornal. 

Oh sim, a prioridade é ler o jornal. O pequeno-almoço é por conseguinte. E mesmo sabendo que não é verdadeiramente seu, experimenta uma sensação de roubo, ao notar que alguém está a ler o jornal que procurava. Há tempo, tranquilo. Até porque o senhor já parece ir a mais de meio. 

Ainda assim, não simpatiza particularmente com o homem. Desde sempre que embirrou um pouco com ele e aquele ar avermelhado, de quem passa a vida com os copos, e o sotaque carregado que o faz soar sempre boçal. 

#3 Aceitar pequenas derrotas

A última vez que olhou, não há mais de dois segundos, foi quando chegou a torrada, já o primeiro café tinha ido. Esta é que era a altura exata para ler as gordas da primeira página. Por sorte, o burgesso acaba de virar para a última.

Uma dentada, uma olhadela, outra dentada, outro espianço. Apenas para perceber que o tipo voltara ao inicio. Mas como assim? Vai lê-lo outra vez do principio? Não faz sentido, mas está a acontecer diante de todos. Mantendo a calma e a compostura, percebe-se facilmente que a segunda leitura do mesmo jornal não pode ser tão demorada quanto a primeira. A novidade está dada, a surpresa estragada, tudo o que sobra é o detalhe. Quanta paciência há, hoje em dia, para o detalhe? Nenhuma.

A gabardina faz-lhe comichão. Fez sempre. A torrada despachou-se. Alguém vai reparar e trazer o segundo café. Sem uma palavra.

#4 Analisar e concluir

Quando ouve:

- Uôi, olhóPalhares. Estábábêr que numaparecias. Pega lá o jornal, pá.

Percebe que aquele segundo café não será consequência do último terço, meticuloso, do SEU jornal. O ladrão tem comparsas. O abutre tem um bando que vem também bicar a carcaça esfrangalhada. Por isso o compasso de espera, a segunda volta. Afinal, nada mais que um rapto, um quase assassinato, dada a maneira sem jeito de virar as páginas. A gordura a escorrer das margens, a mesa cheia de dedadas negras de tinta. A mulher ao lado, resignada. Amorfa da pancada que levará e do sexo de que já se esqueceu. 

E o criminoso ri-se, na sua impotência de pila mole, para o Palhares. E passa-lhe a vitima: Toma, abusa-a agora tu.

Pode ser que não seja um crime de monta para a Humanidade. Mas quem define isso? Por norma, cada um por si. Já vimos bem - lá atrás, no inicio da longa historia - em que estado vai a estrutura que é suposto decidir por nós. Agregada a informação, passados a pente fino os antecedentes, estamos postos perante uma atrocidade. Praticamente, vá.

A gabardina grita-lhe na pele, apesar de toda a roupa entre uma e outra. 

Nesta fase, deve o sujeito atingir o estado zen que lhe permitirá vislumbrar o caminho. Saber qual o problema e como contribuir para a sua solução. A bem de si, primeiro, e de todos.

#5 Resolver

O dinheiro fica em trocos certos sobre o balcão. Os passos de regresso à viatura são lentos, a gabardina a afagar as costas das cadeiras no seu movimento esvoaçante. Abre a porta do estabelecimento comercial quase a acariciar o puxador. Completamente. Com a cabeça diz "depois de si, caro senhor, faça o favor", ao assassino, violador. Dá-lhe um sorriso de paz, que o outro retribui com um esgar de dentes amarelos e mau hálito. Está Sol. Está frio.

As abas da gabardina voam para trás das costas, enleadas na suave e gélida brisa. A coronha cola-se-lhe à mão aberta, enquanto os canos serrados lhe dão os bons-dias. O outro mete a chave na ignição e roda-a, antes mesmo de fechar o vidro.

E nem quando os chumbos lhe estilhaçam o crânio na sua trajetória em forma de cone, o anormal entende que até as coisas mais simples, as atitudes mais insignificantes da alarvice, podem perturbar o frágil equilíbrio Cósmico dos nossos tempos.

Vai ser preciso um esfregão de palha-de-aço, para tirar tanto miolo daquele tablier.

...

Soundtrack to murder: A deceit of the eye... 

Da necessidade de uma atitude zen



É precisamente quando a confusão e a incerteza alastram que devemos optar por uma atitude mais calma, ponderada, zen. Como que uma elevação do espírito, permitindo à mente ver a paisagem do alto. De forma a que entenda a floresta, mais do que a árvore. Ao jeito de uma arquibancada sobre o labirinto. Cá de cima, parece mais claro qual o caminho pelo meio da baralhada.

Imaginemos, por hipótese meramente académica, que se vive um tempo em que os aliados de circunstância de um partido menos votado - mas que por via desse apoio é Governo - puxam o tapete da Concertação Social. Aquela coisa por que bradam desde o inicio dos tempos, contanto que não haja. Porque em havendo, lá se vão uns noventa por cento da sua retórica politica. Entalado entre o compromisso assumido e a impossibilidade de o concretizar, o dito Governo deposita fichas na sua altíssima elasticidade - quase à beira do invertebrado - e espera calmamente que a Oposição faça o serviço da maioria parlamentar. Que decidiu meter baixa.

A bem da nossa tese, vamos convencionar que a dita Oposição andara a defender a medida em causa ao longo de quase todo o tempo em que fora Poder. Só que a vingança se serve fria e, por isso, agora mudara de ideias, num "eles que se amanhem como puderem". Equiparando, pois, o seu grau de elasticidade vertebral ao do Governo, ele próprio. Se fosse um circo, tínhamos aqui uma trupe de acrobatas e contorcionistas bem catita.

Mas isto é quase ao nível do relvado. Subindo um pouco, já se deteta o Luso padrão de irresponsabilidade geral e pequenos mesquinhos pouco preocupados com o Bem comum:

Eu perco, mas meto-me na cama com estes vermelhos e, afinal, já ganho.
Tu ganhas a defender branco. Como afinal perdeste, já é tudo preto.
Eles levantam-me em ombros enquanto te desanco. Mas deixam-me cair todo inteiro no chão de paralelos, assim que lhes convém. Ou não convém.
Vós, trabalhai! Continuai a correr nas vossas rodas, pequenas cobaias amestradas. A olhar sem ver. A ver, sem reparar.

Entretanto, o Mundo assiste à posse do Homem Mais Importante. E ele ameaça espirrar e constipar o Universo. E as cobaias correm, correm. Ele ri com ar boçal e exige que todos se dobrem, confiando na desmedida flexibilidade que alguns tão bem demonstram. E as cobaias correm, correm. A roda gira, gira.

Pode ser que não seja nada, já passa, uma constipaçãozita talvez. Corre, corre, gira, gira. Perde-te no labirinto, não avances escada acima, não olhes do alto. É só uma brincadeira de meninos ricos. Já passa, pequeno soldadinho de chumbo.


  

  

quinta-feira, 19 de janeiro de 2017

2017



Olá, sou eu. Como estamos hoje, meu Amor?

Nós cá vamos, já lançados neste ano todo novo. Como são todos os anos, pois claro. Mesmo que este nos pareça o primeiro que é mesmo, mesmo novo. De diferente. Mas é mentira. Os que lhe estão para trás e os que lhe sucederão, também eram - serão - completamente imaculados. Como folhas limpas de um caderno também ele novo. Digamos que este tem a infeliz especificidade de ser o nosso primeiro sem Ti, daquela maneira usual, corpórea, bilateral. Não é pouco, mas é só.

Sabes, os anos passam muito depressa, quase não dou por eles. Estou mesmo convencido de que deixam de passar por volta dos 16. Ou dos 26, com boa vontade. São lapsos de tempo minúsculos, acelerados por esta mania de marcar dias. Vê lá se não tenho razão:

Ainda agora é janeiro e frio, praticamente em cima do Carnaval. Não tarda, estou a acordar na garagem - filhadaputa de mania! - prontinho para preguiçar a Quarta de Cinzas inteira - a chuva tenha permitido o desfile - direto à Quaresma.

Quando se desvanecerem os vapores etílicos, o fígado for ao lugar e mais ninguém tiver fotografias para me mostrar, de coisas de que não me lembro - sobretudo abraços a estranhos e tentativas de sedução a roseiras nos jardins - há-de ser já Sexta Santa. 

Ah sim, é evidente que o cabrito de Domingo me sabe sempre a Verão. É assim desde a escola. Vai estar Sol e o Porto vai ser campeão em maio e vamos deslizar nestas alegrias de Alma e de estômago até agosto. Ou julho que seja. Às férias. 

Ao momento em que o Phineas me desce e, sem dizer a ninguém - fechado na casa de banho, provavelmente - faço contas a tudo o que vamos fazer nos longos dias de ócio. Quase nada, esperançosamente. Só gente que se Ama e gargalhadas e cerveja gelada. 

Já se sabe que nunca é tão perfeito, mas o facto de ainda o pensar renova-me a certeza dos Amores, da Alegria e da Vodka. Eu não gosto assim tanto de cerveja.

Viste? Acabaram as férias e a energia do regresso adianta o relógio estupidamente. Quase não dou pelos reencontros de setembro, baralhado pelos fusos horários e as recordações das latitudes, escarrapachadas numa rede social qualquer. Epá, mete-se o Natal! Já?

E outro ano que também será novo. Se me garantires a mesma companhia, não me importo de o inaugurar com as mesmas lágrimas. Rio-me no inicio de 2019, pronto.

...

Olha outra coisa, estou a pensar se por aí também tomam decisões de Ano Novo e isso tudo. Tipo, ah, este ano vou assombrar aquela casa; ou este ano vou ter mais cuidado com as larvas; deixar de fumar, ou assim. Naaaa, não sejas mentirosa.

Eu espero apenas conseguir desviar-me do caminho dos meus bocados de felicidade. Quero dizer, não os impedir. Não ser eu a atravancar as passagens estreitas por onde se movem. Para que possa colecionar tantos quanto possível, ao longo destes curtos dias de 2017. Ou pelo menos, para que não me censure por ter sido eu a evitar alguns. Como decisão de Ano Novo não está mal, hein?

De resto, Querida, desejo o mesmo de sempre: Que Eles, Todos, rebentem a escala da Felicidade Possível; que ganhem novos Sonhos, por terem cumprido os que agora lhes parecem inatingíveis; e que me contem aquilo a que não assistir. 

Como "para mim"? É isto! E não é nada pouco. É isto tudo que quero para mim. Garganeiro, pois sou? Mas olha que eu sei que Tu não imaginas maior Felicidade em Ti, do que a Nossa Felicidade. 

Same here, mas bem sabemos que às vezes me distraio. Don't we all?

...

Prometi que ia deslindar esta confusão do Amor em via única, uma vez que V.Exa continua a embirrar nesse silêncio.

Ainda não cheguei lá, mas vou avançando. Por agora, tenho uma certeza grande de que Vives na Saudade que me recuso a ter. Por isso Te falo e partilho algumas das nossa conversas. 

Porque, apesar da má educação de V. Senhoria, isso me ajuda a tornar-Te uma espécie de matéria. A Voz - credo, outra! - na minha cabeça ou no meu coração. Enfim, uma coisa que existe, que É, que não invento. Porque a sinto. É quase alegre, não achas? 

Sim, continuamos a rir muito, feitos parvos. Eu e Tu.

Ainda tenho que descobrir se este Amor desprendido, pois de Ti não espero nada e Tu de mim de nada precisas, não é a verdadeira essência do teu legado. Não sei bem se faz sentido. Olha, Amo-Te na mesma, essa é que é essa.

Não sei quantos Anos Novos passarão até que não consiga já reproduzir o som da Tua voz. Se calhar mais nenhum, se calhar nunca mais. Mas hey, nós vamos falando. Até já.

...

- Senhor... - Com determinada cachopa pela mão.

Ele vira-se e contempla-os. Reprime um sorriso e diz, a forçar os vincos da testa:

- Esta, outra vez? O que foi agora, Pedro?

- Apanhada a fumar na casa de banho, Senhor.

Ele dá uma palmada na Bendita testa.

- Lindo serviço, minha menina. Vamos ter que conversar com a tua Encarregada de Educação...

...

Soundtrack to 2017: The light you left remains...



segunda-feira, 16 de janeiro de 2017

Da bola e da bancada



Então diz que acabou a primeira volta. Conclui-se pois que a festa do título 2016/17 começa no Dragão, contra o Paços de Ferreira, e só acaba em Moreira de Cónegos. É bem catita, que eu gosto de rojões, sarrabulho e verde tinto. Daquele que se bebe da malga e faz estalar a língua no céu da boca.

A propósito disso, ontem ganhámos ao Moreirense. Tipo ensaio para a festaronga de maio. Houve três coisas que me ficaram do jogo e outra da bancada. 

...

Da bola:

1) O NES acertou em cheio na conferência de imprensa: Não foi muito diferente do jogo anterior. A bem dizer, é capaz de ter sido até piorzinho, embora mais sossegado. Verdade, verdadinha, não foi muito diferente da esmagadora maioria dos nossos jogos. Oportunidades para nós, quase nada para os outros. Desta vez, metemos golos e o árbitro não inventou por aí além. Duas diferenças que fazem toda a diferença.

Ou seja, nem brilhantes ontem, nem miseráveis há uma semana. Com um pouco mais de tino e menor inclinação dos campos, estaríamos bastante melhor do que a quatro pontos do primeiro lugar. Provavelmente, estaríamos a uns quantos pontos do segundo. Logo abaixo de nosotros.

2) O Brahimi está na CAN. Esse, não é o problema. Arma-se a equipa de maneira diferente e a coisa chega para os Tondelas da vida. O verdadeiro problema é substituir Oliver Torres por André. Não vai dar, pessoal. Há futebol enquanto o Tsubasa está. Deixa de haver quando ele vai descansar para o banco. Sobretudo se o treinador se esquecer que tem o Teixeira à mão.

Sendo que não percebo porque se há-de descansar malta que só tem que jogar uma vez por semana. Isso dos minutos aos menos utilizados é para a Taça da Liga. Ah, mas disso já não há. Pois azar! Eu cá pago bilhete por inteiro. Se é para acabarem os jogos aos 65 minutos, então comecem a vender entradas a metro. Olhárquibancada até aos sessenta; olhálateral só prá primeira parte; e assim por diante. 

3) Porque carga de água se está a dar cabo do promissor Rui Pedro, obrigando-o a fazer o papel de barata tonta? Deixem o rapaz jogar na B. É melhor para ele e, por conseguinte, para nós. A que se deve a pressa? A um golo aos 95 minutos - que o Depoitre não marcaria, reconheço - apenas? Epá, isso já está, pronto, maravilha. Aquele quarto de hora de ontem era do Belga. E os 90 minutos de anteontem, contra o Aves, eram do Rui Pedro. Estou farto de vos dizer que as cadelas apressadas parem cachorros cegos.

Como resumo desta primeira metade do campeonato, podemos dizer, sem medo nenhum, que em condições normais estaríamos à frente. Em condições basto anormais, estamos a quatro pontos. Juntem-se as Taças que foram embolsadas pelo Apito Lampião e estaríamos a roçar o brilhantismo. Sem sermos brilhantes, muito menos consistentemente.

Até ver, as grandes vitórias de NES são a solidez defensiva e o espírito de grupo. Se a primeira não se estranha, porque é normal que o FCP sofra poucos golos em Portugal; a segunda, a manter-se, é uma lufada de ar fresco. Por si só, não faz grande merda. Mas a juntar a uma maior eficácia, dá um jeitaço. Se for a um melhor futebol então, ui, ninguém nojagarra!

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Da bancada:

O senhor chegou aos 5 ou 6 minutos de jogo ao setor quase vazio. Puxou a primeira cadeira da fila 15 para baixo e sentou o rabo. Agora, acho que sei o que remoía entredentes: Pracaso, chegar à hora, tábem tá. Eu chego quando quiser, esses filhasdaputa não mandam em mim. Cabrões do caralho, marcam os jogos para a hora que querem, mas eu cá chego à hora que mapetece, filhos duma grandaputa.

Ajeitou o gorro de lã azul e branco e, pela primeira vez, olhou para o relvado. Gritou: Corre práfrente, seu filhadaputa. É muito difícil, chulo do caralho, filhadaputa? Correi, filhos duma grandaputa! Olha-me praísto, olha-me praísto, foda-se, andam a gozar comigo, estes... Yep, vocês perceberam.

Para não repetir mais cinquenta parágrafos de "filhasdaputa", deixem-me só acrescentar que este nosso adepto (?) não festejou nenhum dos golos. Aliás, acho que ficou até muito zangado com o primeiro, do filhadaputa do Espanhol anão, cabrão de merda, filho de uma grandaputa, chulo. E foi-se embora com o mesmo ar muito zangado com que entrou. Cinco minutos antes do fim.

Eu sei que o senhor pagou bilhete, como eu. Admito até que aqueles 80 e picos minutos sejam a sua catarse. O momento em que deixa de ser apenas um homem a caminhar para o fim da vida, amargo da pancada que levou, azedo da mulher fria que o espera - coitada!, em sofrimento da ingratidão de filhos ausentes, por quem tudo fez e tanto trabalhou.

Ou então é mesmo só má pessoa e é mesmo aquilo que entregou sempre aos seus. À sua família, aos amigos que não teve, ao Clube do seu coração. Seja, não devo - não posso! - julgá-lo. Pelo contrário, peço-lhe desde já desculpa, porque não tenho nada com a sua vida e nem com a forma como vê a bola ou torce (?) pelo nosso FCP. Não me devia incomodar e não devia estar para aqui a tecer considerações a seu respeito. Ainda por cima, pouco abonatórias.

Mas deixe-me que lhe diga, caro senhor que não conheço e não conhecerei, que eu também pago o meu bilhete. E por isso, sinto-me roubado. Por si. Uma parte significativa do prazer que quis pagar com o meu dinheiro, foi triturado pela sua presença. Nem tanto pelo que vociferou - eu até poderia ter achado piada, acredite - mas sim pelo ar com que o gritou. Pela sua expressão profundamente irritada com tudo e todos, pelo facto de me parecer que o melhor que lhe poderia ter acontecido era o FCP ter perdido por cincazero.

Creia, o meu pensamento foi para os filhos que não sei se tem. Espero que todo esse fel ao que se ama lhe tenha sido canalizado para o azul e branco. De coração nas mãos.

E não, eu não resolveria nada trocando de lugar. Porque ainda hoje, um dia passado, me sinto agoniado. Não pelo que disse, mas pelo facto de o seu gorro ser azul e branco e de este ser o seu Clube. E por ser dessa forma que o senhor puxa por ele. A partir do momento em que tomei consciência disso, deixou de fazer diferença se o ouvia do meu lugar ou não.

Oh well, no fim, o que lhe quero mesmo dizer, senhor do gorro azul e branco, é que eu não tenho nada com isso e que acho muito bem que vá a todos os jogos e os veja da mesma exata maneira. It's all about me, not you.

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Soundtrack to disappointment: The other way around?

quinta-feira, 12 de janeiro de 2017

O Futuro (não!) é amanhã




Há muito tempo, e durante uns tempos, gostava de me vangloriar - oh vã glória da estupidez - de olhar para o Tempo de um modo peculiar: O Presente não existe, tudo é Passado ou Futuro. Porque Agora já passou e Daqui a Pouco ainda não é.

Claro que depois a pessoa limpa as ramelas do início da adolescência e começa a ter uma certa vergonha de dizer disparates. Mesmo que soem suficientemente estranhos para parecerem inteligentes. Apesar disso, é provável que encarar a Vida daquela perspetiva me tenha evitado uma série de problemas. Que estavam ali mesmo à mão - e de mão em mão - de semear.

É que, na verdade, viver sem Presente torna a Vida numa permanente retrospetiva. Ora, está claro que retrospetivar implica alguma espécie de julgamento. E nem um puto estúpido gosta de se achar um grande parvo.

Por outro lado, também implica viver no constante anseio pelo que lá vem. O que vai acontecer depois, a seguir. Já a seguir. Pelo que é melhor lá chegar em condições de o descobrir. Postura que não se coaduna com seringas nas veias, traumatismos cranianos ou companheiros de cela musculosos. Na hormonal força da idade. Credo.

Apesar de me ter proporcionado algumas vezes aqueles minutos, preciosos, de indecisão feminina - a aparência de inteligência é um poderoso afrodisíaco, só superado pela inteligência, ela própria - fico contente por não ter demorado muito a perceber que o Tempo se conta de outra maneira. O que foi inteligente. Oh yeah!

- Tem rachão, Xilva! E a quantidade de rabochintelichentej que práí andam? Ui!

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Tanto, para vos dizer que o Futuro, ao contrário do que bradam, não é amanhã. Pode ser Amanhã, mas nunca amanhã.

É certo que nos pode cair um piano de cauda na moleirinha, mas nada na nossa experiência passada, ou neste preciso momento, nos indica que vá acontecer. Ainda que aconteça, isso não é Futuro. É Fim. Ou uma série de fraturas, no mínimo. Pelo sim, pelo não, evite-se passar muito tempo debaixo das varandas do São Carlos.

O que quero dizer é que o Agora, sendo condição do que se segue, não se pode confundir com o Depois. Os nossos atos terão um reflexo, é certo. Mas isso não significa que devamos agir como se estivéssemos lá à frente. Amanhã.

- Xem dúvida, Xilva! Xenão, não xe come a gacha. Fuma-xe logo um xigarro!

- Pumbas, nem mais! Abençoado Berto.

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Por exemplo, na bola - aaaah, tanta letra para cá chegar! Eu acho muito bem que se pense o Futuro do FCP. A todo o tempo. Espero bem que a estrutura atual o esteja a fazer.  

Também acho legítimo, e muito desejável, que outros tomem essa tarefa. A começar nos adeptos que o queiram fazer - porque obrigação não têm nenhuma - acabando em quem aspire a cargos.

Na minha opinião, deve ser uma reflexão estruturada, profunda, com um elevado sentido de responsabilidade e despojada de qualquer objetivo pessoal. O que a interdita a políticos de carreira, já se sabe; a homens de negócios sem escrúpulos; ao Bruninho e ao Octopus Orelhudus

Isto é, o fio condutor é a Paixão por Essa bandeira. Azul, Branca, Indomável, Imortal. Que avança. De que forma avança, é o que podemos pensar.

O que não entendo é alguma sofreguidão. Não sou assim tão tanso e percebo a politiquice: O incêndio Agora, para ter madeira à borla Depois. Só que me custa a entender que isso possa ter como motivação o Amor; e como fito o Bem.

Porque esse Futuro, que hoje podemos pensar, não é amanhã. Amanhã é o Moreirense! Com André na frente, NES no banco e Jorge Nuno na Tribuna Presidencial.

E os Silvas na bancada!

Defendo que o Presente e o Plano para o Futuro podem, e devem, correr paralelos. Ou seja, tanto quanto possível a cada um, devemos ser Unos e Indivisíveis: Uma Nação nas costas do seu exército. Pronta a empurrá-lo para a Vitória, preparada para lhe tratar das feridas, arrepiante no grito de uma só voz. Que é a Voz do Porto.

Tal não impede que, fora das batalhas, estejamos a analisar o Passado e o Presente - a julgá-los até - a delinear, de forma organizada e exaustiva, o que queremos que seja o Futuro. 

Caminhos vários serão, está claro, encontrados. Para se chegar a sítios diversos. Mas a um objetivo único: Fazer do FCP ainda mais, maior, bom! Qual seguir, será uma decisão de quem mais ordena. E não será amanhã.

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E tu, tantas palavras depois, o que gostarias que se fizesse, Silva?

Gostaria que um molho de gente de diferentes sensibilidades pensasse, ponto a ponto, como deveria ser o FCP do Futuro. 

Que as conclusões dessa reflexão fossem disponibilizadas a quem lidera e a todos os que se manifestarem disponíveis para avançar por essa liderança. Depois, ao nosso Povo, aos nossos irmãos. A ti, a mim e ao Luis.

Mais útil que pendurar tarjas e pintar paredes, é de certeza.

E tu, que achas?

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Soundtrack to the Future: Come with me!