quarta-feira, 22 de agosto de 2018

Resumo da semana: #justsaying

E pronto, cá estamos chegados ao deprimente quase a acabar. As férias. Fico num estado esquisito, tão depressa asténico, derrotado, praticamente falecido, velado e enterrado; como, logo a seguir, me dá a travadinha e sou um puto hiperativo, cheio de coisas por fazer antes que se me acabe o tempo e tento mergulhar numa onda, ao mesmo tempo que fumo um charro e bebo yet another mojito, sem perder o controlo da bola que a malta da praia está a contar que resolva o jogo.

Isto das férias divididas em fatias aborrece-me porque estão sempre a acabar. Ainda agora me sentia a recuperar da depressão pós Ras Al Khaimah e pumbas, all over again. Parece a pessoa que está continuamente a acordar, precisamente na parte do sonho em que a mais que tudo se vai engalfinhar com a Scarlett. Não se faz a um gajo, caraças.

Enfim, mantenhamos o pensamento positivo. Ficam para trás belos dias de Sol, sem sal. E belas descobertas, como a Aldeia do Mato e, sobretudo, o Carvoeiro. Ainda melhor, o senhor Artur e a dona Filomena e as suas Casas do Lagar, de onde a gente não lhe apetece ir embora, tão em casa que se está. Depois, por estranho alinhamento cósmico, fui dar a sítios que já não fazia ideia onde ficavam, nos quais amigos me deram guarida e festa, faz mais de 30 anos. Surpreendentemente, reconheci o terreiro dela, da festa, o sitio onde tocava o conjunto, a zona onde se vendia cerveja, a rampa pela qual correu esbaforido o Zé Vasco, perdido de bêbado desde dois dias antes, atrás de alguém que, por qualquer motivo, ele achava que devia apanhar nas trombas. Está alcatroada, Zé, a rampa da festa da tua terra.



Reencontrei as lambretas e os copos de três. E os míticos Ferro & Fogo, a tocar numa aldeia cheia de rock.


Não sei bem a quem, ou a que, agradecer, mas obrigado. #justsaying.




...


Entretanto, foi havendo bola. Sobre o nosso FCP, está tudo em A Culpa é do Cavani. Há tanto para dizer mais, que até o "O Jogo" tem que se pôr a fazer artigos da treta sobre o facto de o Oliveira ser o melhor tipo a tirar a bola aos outros, ao fim de...dois jogos. Já depois de terem descoberto que este é o melhor inicio de época da carreira do Otávio. Olha que era difícil, hein? Se nos poupassem a isto, a gente agradecia. Vá que temos olhinhos nas trombas e não comemos gelados com a testa. Estou fartinho de vos dizer que nós não somos lampiões!

Porto à parte, diga-se que é hora de um grande shout out  para o Nuno Manta e seu Feirense. Nem tanto pelas duas vitórias e seis pontos - tantos como os matulões - mas sobretudo pelo que vem fazendo há duas épocas, com planteis que não tenho a certeza se seriam suficientes para ser favorito à subida na segundona. Quando nos apetecer choramingar acerca da tal profundidade das nossas azuis e brancas opções, é botarmos ujólhos em Santa Maria da Feira. Se esta malta consegue, a Champions não é miragem nenhuma para o FCP. Justiça seja feita, ao contrário do senhor Azul e Branco, que aqui há atrasado me referiu estar de olho no Manta, eu desconfi(o)ei um pedacinho da capacidade deste jovem para amassar esta fogaça. Bem, aqui está, xôr Nuno, a contrição. Agora esquece-te de desceres este ano, só para me contrariares...

Do outro lado, o xôr Castro que, como bem podeis comprovar em muitos e variados posts desta reputada casa de pasto, não é moço da minha preferência. Parece-me sempre que se as coisas desatam a correr mal, ele não tem como lhes dar a volta. Não que se possa dizer que lhe esteja propriamente a descarrilar a vida, ainda é cedo e quatro derrotas nos quatro primeiros jogos oficiais não é o fim do Mundo. Sim, quatro, porquê? No entanto, faz-me confusão que um tipo que tem que alterar profundamente o modelo de jogo da equipa - o Pedro Martins é de outra escola, se de alguma... - ache boa ideia trocar meia equipa da primeira para a segunda jornada, depois de ter feito tremer um dos candidatos ao titulo. Quando vem justificar que aquela foi uma derrota muito traumática e que ainda não conseguiu resolver isso com os jogadores, aí disparam os alarmes, digo eu. Well, pode ser que tenha sido apenas excesso de copos de três. Infelizmente para o Vitória, o Folha está em Portimão. Também leva na corneta como gente grande, mas basta olhar para a diferença no discurso para me perceberem. mas mantenho grandes expetativas na época do Guimarães, mesmo com o Castro. Pode ser que faça clique. Ou não. Olha, o Capucho está mesmo no fim da auto-estrada Guimarães - Litoral. #justsaying.

...

La Geringonce vai reverter o molho de bróculos que o PAF tinha arranjado com a Lei de Reorganização do Território das Freguesias que, como se sabe, foi feita seguindo o método legislativo de atiréssamerdóarilogocevê. Portanto, mais uma prova de visão a longo prazo dos políticos portugueses. Chegue a altura da alternância e lá teremos outra vez que reordenar o que estava mal ordenado e depois foi reorganizado desordenando. Hã?

Não percebo lá muito bem porque é que a Catarina e os seus Bloquinhos haveriam de achar isto boa ideia, tirando o facto de porque sim. É que, ao contrário do tio Jerónimo, o seu poder autárquico é absolutamente bola. Zero. Nicles. Talvez esteja de olho em algumas freguesias dos centros urbanos, onde ainda é cool ser BE desde que não conheças alguém chamado Robles - ai credo, arreda que tem gosma, mata com fogo antes que se reproduza. Desconfio que vai dar com as Mortáguas na água e o velho tio é que se fica a rir.

Para mim é absolutamente tinto. Mas tinto da Tasca, daquele que o nosso mister gosta. A única coisa que me aborrece é se vamos ter novos candidatos à presidência das novas freguesias que, a bem dizer, são as velhas freguesias. É que desconfio que foi preciso meter a martelo muito Presidente da Junta que se viu privado da junta para presidir, nos quadros do Estado e nas Autarquias e assim. Se agora vêm novos, é uma porra para os meus impostos. Sofrem muito das cruzes, os meus impostos. Quando aumentam o peso que carregam, queixam-se logo.

Vai daí, cagari-cagaró para as reformas territoriais desta maralha. Façamos de conta que teremos Trotskistas e Marxistas-Leninistas a influenciar a governação do Estado durante uns 20 anos e que, portanto, o novo ordenamento se manterá por umas décadas valentes. Seja. Mas havia de ser obrigatório que todos os ex-autarcas, entretanto passados a funcionários públicos, sejam candidatos aos cargos que ocupavam nas extintas freguesias. Novas freguesias. Ex-extintas freguesias. Coiso. #justsaying.

...

Olha-o com manifesta surpresa. Dir-se-ia com uma fagulha de recriminação, até. Mas disfarçada, dissimulada no joelho no chão e na reverência das mãos postas.

- Que foi? Tem alguma coisa a dizer, o senhor Pedro, tem?

- Não, Senhor, claro que não. Fiquei apenas surpreendido, só isso. Não esperava esse cuidado com...com...bem, com o parvo.

- Oh, deu-me prá fofura. Acontece-me às vezes, fico doce, doce, doce, já à beira da diabetes. Não posso?

- Ora, podeis tudo, Senhor.

- Eu sei, Pedro. Era retórico. - Revira os olhos. - E ires-te agarrar a uma nuvem? Isto não se faz chover sozinho, poi'não? Pá, #justsaying..

...



quinta-feira, 16 de agosto de 2018

Da Eternidade: Uma mesa ao Sol

 
Olá meu Amor, como estamos hoje?

De férias, é assim que estamos, colecionando momentos irrepetíveis, como se houvesse momentos de outro género, como se fosse possível regressar, repetir, copiar. 

Como bem sabes - uma mesa num café anónimo, no tempo em que todas eram de fumadores, uma espreguiçadeira à beira de uma piscina de cloro, tu deitada, eu sentado aos pés - não consigo evitar esta coisa de colocar os ausentes nos locais de agora. Se calhar é só uma forma de lhes dar férias, de os tirar dos ombros enquanto salto para a água, eu mais leve, eles livres deste jugo que lhes imponho. A Ti não, que ainda não me parece que tenha aceite completamente que Vives em mim. Apenas.

Deixemos isto, convenientemente, por discutir e resignemo-nos ao facto, de qualquer forma insofismável, de caminhares ao meu lado. Por agora basta-me e Tu não tens como protestar.

...

Sabe-se lá como, vim dar a sítios de churrasco nas margens, minis em punho e cigarros a queimar no fio perdido das conversas, enquanto as brasas pegam. Fomos passando, eu e Tu, por estes locais, trocando olhares cúmplices, até termos desaguado nesta esplanada sobre um rio. A sombra dos guarda-sóis vermelhos espalha-se por uma área apreciável, deixando uma mesa perdida no extremo. Ao Sol. A nossa, certamente.

Aquela em que as tuas gargalhadas parvas se entrecortariam com os acessos de tosse que prenunciam a Morte. Estaríamos praticamente deitados nas cadeiras, a torrar, desfiando um rosário de maledicência e piadas estúpidas. Os dois - ah não, os três! - plenos de Presente, ignorando com a maior naturalidade a Vida, essa coisa que correria em paralelo a uma Felicidade de momento. Lá longe, nas partes incertas onde as pessoas sobrevivem. Até que fosse segunda-feira e nos viessem agarrar pelo pescoço e esbofetear-nos com lambadas de realidade. À bruta. E saberíamos então que a culpa era completamente nossa. Como a mesa ao Sol, esquecida pelo resto da esplanada.

Na relva da margem, repousaria a enorme geleira. Façamos um breve inventário: uma bola de queijo flamengo, 350g de fiambre, um chouriço, quatro pacotes gigantes de batata frita, 20 ou 25 latas de cerveja, gelo, duas garrafas tamanho familiar de Coca-Cola, quantidade indeterminada de papos-secos, abre garrafas, uma faca de cozinha, um pacote de manteiga, um melão e uma melancia.

É certo que se entregar esta lista a qualquer um dos outros, ela crescerá, até se tornar uma geleira imensamente impossível, daquelas que podem carregar toda a Alegria do Mundo. Nenhum de nós pode ter a certeza se existia ou se foi  um épico sonho coletivo.

De pernas cruzadas à chinês, preparas em facadas certeiras as nossas sandes de queijo, com manteiga e batata frita. Os miúdos correm soltos e felizes, mergulhando no Mar da nossa inconsciência, e vêm à chamada da fome. Comem em pé, a pingar água, e sorriem. E depois riem. Porque por qualquer estranho motivo parece que não aprenderam outra coisa. E a gente aperta o pão e ouve as batatas a estalarem lá dentro e antecipa a mistura das gorduras e do sal, a maciez do flamengo e o crocante das batatas e depois o gás do malte ou do caramelo dispara uma bolha para o nariz e os portões do Paraíso abrem-se de par em par.

Os bebés espalham-se pelos seus vários pontos cardeais e nós retomamos o caminho da esplanada ou da sesta ou da geleira. Quando nos cruzarmos, alguém os empurrará para a água e depois saltaremos todos e as pessoas vão ficar a olhar. Como se o Mundo não acabasse depois do jantar.

A quantidade de escolhas racionais e partidos ponderados que estas coisas que não sei dizer me impediram de fazer e tomar, é algo que já tentei explicar milhares de vezes. Sem sucesso. Nunca passei de está perdoada à partida e serei sempre eu a dever no fim.

...

Às vezes ainda caio na esparrela de me pôr a pensar que podíamos, os que vamos sobrando, repetir, em conjunto ou cada um com os seus, estas jornadas de “vamos ao Algarve amanhã, mas acordou mau tempo e vamos em direção à Serra da Estrela, mas só até à Mealhada”. Porque é hoje. Pouco importa que tempo fará amanhã.

Mas sabes, não podemos. Continuamos a ter, descansa, parvoíce que sobeje para as gargalhadas. Temos bebés em número muito razoável e até, ou mais que tudo, a Tua Memória religiosamente preservada. Somos é outros, em outro tempo, transportando outras vidas. E não me passaria pela cabeça empurrar qualquer das crianças para dentro de água. Só os pais delas. As mães, para ser completamente exato.

Eu podia só dar-Te a mão e levar-Te a passear, porque a vista é bonita e o ar agradável. Deixar-me ficar calado, em vez de Te maçar ainda uma milionésima décima vez com a mesma história. Mas depois ia contá-la a quem? Não sei, a todos, talvez? Um dia ainda encontro a resposta para isto. Mas hey, nós vamos falando. Até já.

...


segunda-feira, 13 de agosto de 2018

Embandeirar em arco

Conta-se em duas penadas a sabe-se lá se triste história de Cláudio R. da Silva:

Nascido devidamente equipado em tamanho para o amor, desde tenra idade espantava pela  impecável aerodinâmica e muito apreciável estética peniana. Enfim, o que se convencionou chamar de bela pila.

Mais até. Cláudio revelou desde os primeiros ensaios uma inata aptidão para a cópula. Não que isso o surpreendesse, dada a arrasadora onda de sublimes sensações que o tomavam quando, petiz, praticava o ato de si para consigo. Espancava o macaco, portanto.

De família, carregava os genes da simplicidade e da humildade, a esmerada educação dos modestos e a certeza de que, desconfiando de si mesmo, poderia manter sempre os pés bem assentes no chão. Daí que sempre que um amigalhaço de ocasião lhe dizia: Oh Clau, a minha prima bem boa diz que lhe disseram de ouvir dizer que era melhor ligares-lhe enquanto os meus tios estão embarcadiços, num cruzeiro demorado; o bom do rapaz respondia: Pá, não é tanto assim, tenho muito que melhorar e há aí malta muito competente e bem preparada e que investiu em operações e faz ginásio e essas coisas todas. Não vamos agora embandeirar em arco.

De tão pouco embandeirar, tanto se convenceu do que pregava, que nunca mais deu uma em condições. Ainda hoje, cerca de 85% da freguesia feminina da Tasca vive a repetir: Credo, que desperdício ter ido para panasca.

O que é prontamente rebatido por uns 32% da freguesia masculina.

Com pedaços de bolinho de bacalhau a lutarem pela vida nos cantos da boca, o Berto Faz Tudo dá sinal de vida:

- Eu cá embandeiro um pedachinho para a exquerda. E tu Xilva?

...

Ora então começou o Campeonato. E abriu da forma mais natural: Cincazero, Silva. Como era de esperar, meio Mundo desvaloriza, à conta de um adversário supostamente morto; e outro meio já desatou a berrar que não devemos embandeirar em arco. Lá está.

De acordo amigos, a soberba, como a gula, para além de pecado, pode fazer mal ao intestino e, de repente, está a pessoa com uma caganeira do caraças. Mas não precisamos de fazer de conta. É que não sendo um dos sete, a hipocrisia é o grande pecado do Homem. E fazer maki com morango e compota de framboesa também!

Deu-se o caso de ver os jogos dos supostos adversários. Não é que possamos encomendar as faixas, mas devemos ter a honestidade de reconhecer que partimos à frente. Um pedaço. Grande. O mais próximo será o S.L.Braga.

Percebe-se. Estamos em modo continuidade, afinando o modelo, suprimindo defeitos, enfim, aperfeiçoando e não construindo. Essa é uma vantagem e o melhor é que, pela amostra, não estamos nada inclinados a prescindir dela. Eu espero um FCP bem melhor do que o anterior e o treinador também. É isso não tem porra nenhuma que ver com jogadores novos. Anyway, se alguém tiver por aí esquecido um lateral esquerdo dentro do prazo...

Pronto, não embandeiremos em arco, para não ferir o politicamente correto. Mas pelamordeDeus, não me comecem já com as finais, a Vida e a Morte, o fim do Mundo sem Suecas desnudas. Ninfomaníacas. Porque haveremos de dar gás ao colinho mediático que vai tentar disfarçar vitórias sofridas, fabricar soberbos craques que encherão de esperança os rubrósverdeados corações e estupendas exibições durante 10 minutos?

Foda-se, somos melhores, estamos melhor, mais fortes, mais rápidos, mais alto. Fodemos melhor, pronto. Porque é que haveríamos de esconder isso das moças? Ganhar vantagem ao primeiro olhar é uma bela estratégia.

Isto é embandeirar em arco? Well, eu é um pedacinho para a esquerda também.

...

O desproporcional do Nélson Évora ganhou o Campeonato da Europa. Já antes tinha sido Campeão Olímpico e Mundial. Eu não sei se alguém já tinha feito isto antes, já? Mesmo que sim, mas desconfio que não, é seguramente um dos maiores, senão o maior, feito do desporto nacional! Que golos do Cristiano em jogos treino contra equipas B mereçam mais destaque, não diz apenas da me(r)dia que temos, diz também do Povo que somos. Que não somos, digo. Mas podíamos ser.

Só não percebo como o gajo consegue. Eu próprio ando hácanos com um par de meias, daquelas de futebol, metido nos boxers e não há meio de saltar nada que se veja, fuoda-se!

Acho que o truque do moço é usar um calçonete de licra muntapertado, mais parece que vai fazer Ponte Nova - Furadouro ao Domingo, à rasca para ser atropelado por um BMW de aluguer com matrícula Suíça. Aquilo revela ao enfado - bota enfado nisso, filhadaputa - a meiucha metida nos truces e pumbas, até parece o gajo que voa.

Ora nem mais, o que o Évora faz é não esconder o arco. Ou a bandeira. Embandeira em arco, lá está. Aposto que é um pedacinho para a esquerda. Quer dizer, tendo em conta a proporção, um bom bocado, vá. Damn!

...

Alarcón, FCP! É isto, a propósito de malta que anda por aí em licra a mostrar com quantos mastros se faz um embandeiranço. Empandeiranço. Coiso.

sábado, 11 de agosto de 2018

Sábado B: De pequenino...

Kié? Apeteceu-me e depois? A espelunca é minha!

Ah, gosto tanto do inicio de época dos B. Porque são equipas completamente novas de dois em dois anos, no máximo. Curiosamente, a primeira coisa que me chama a atenção nos B deste ano, é que há gente demasiado "velha" para cá estar. A única explicação plausível para mantermos Rui Moreira, Rúben Macedo ou até Rui Costa, é toda a estrutura, treinador principal incluído, estarem convictos de que se tratam de verdadeiros backup ao plantel principal. Vocês acreditam? Eu não. Aliás, o único que entraria nesta categoria não foi, propositadamente, referido. Falamos dele a seguir.

Uma equipa à imagem do seu treinador: honesta, simpática, sorridente, ingénua. Montada num sistema que pretende ser o espelho dos A, mas à qual falta gente para isso. De facto, este FCP B devia - e creio que o Rui gostaria - jogar em 4-3-3 e não no "nosso" conceicionista 4-4-2. Sendo certo que a me agrada este jogo de sombras, porque prepara jogadores para serem alternativas "imediatas" em caso de necessidade, não é menos verdade que se correm riscos ao levar demasiado à letra o conceito.

Por exemplo, nem quero pensar no que estaremos a fazer ao bom do Luizão se o obrigarem a jogar uma época inteira a ala direito. Não só o moço não tem características para isso, como a equipa perde muito com a sua ausência no meio. Em termos defensivos e ofensivos. Por outro lado, é o rapaz com mais possibilidades de dar uma perninha na A, porque já por lá andou e porque tem pernas e pés para isso. Quem sabe esta nova posição não visa prepará-lo para poder tapar um qualquer buraco na direita do nosso meio campo A. Pessoalmente, acho que não vai resultar. Mas hey, eu também achava que o André Pereira não sabia jogar o suficiente à bola para ser jogador do Porto. E ainda acho, mas ele é!

Outro rapaz que tem que estar pronto, até ver, para responsabilidades mais elevadas, é o Oleg. Apenas porque não há alternativa para Alex Telles, uma vez que não me parece que este catraio louro esteja preparado. Dará para o gasto? Que remédio tem ele. Veremos no decurso da época.

...

Vamos lá à malta que jogou o primeiro jogo da II Liga:

Baye - Banco assim que chegar o Diogo Costa. Mas não é pela baliza que as coisas correrão mal.

Musa - Eish, época difícil que vai ser. É que ser ala direito no 3-4-3 do Folha é totalmente diferente de ter que ser lateral direito agora. E tu Musa, não és.

Justiniano - Rápido, inteligente, frio (não, não fez um penalty, mesmo que tenha sido apitado). Gosto.

Bidi - É grande. É bruto. É grande e bruto. Está emprestado pelo Lusitano de Vila Real. Tudo dito?

 Oleg - Veremos...

Rui Moreira - Já o conhecemos, fará o que sempre faz, desta vez com a grande novidade de jogar no seu lugar de origem. Não será A e só pode ainda aqui estar porque precisamos de um capitão. Devia estar a tratar da sua vida, porque pode ser um belo jogador de uma boa equipa.

Kelechi - Forte, bom de bola, chuta bem, o jogo da equipa anda todo à volta dele. Falamos daqui a uns jogos.

Luizão - Tudo explicado lá em cima. Não é à direita que se pode fazer jogador a sério.

Macedo - Outro que podia muito bem estar a ganhar cartaz numa equipa qualquer que lhe permitisse ter uma carreira a sério nisto da bola. E o Varzim precisava tanto dele.

Irala - Titular porque temos que jogar com dois avançados. Não devia. Até porque era suposto este lugar ser do Maleck. Kédele?

Rui Costa - Se era para ter um Rui, podia ser o outro, não? O que ninguém sabe onde pára, por exemplo. O Costa é bom, nada de confusões. Mas o outro é melhor...

Baró - Como - mas oh Deus, como? - é que este petiz não joga assim de caretas? É olharem para o que foi a bola desde que ele entrou. Sobretudo nas partes em que não estava obrigado a ir defender...à direita. Que pancada, dass!

Cassamá - O problema é como é que te arranjas para caber no lugar do...de cima. Mas juntos, é um regalo. E foi, por 15 minutos. Problema: sofremos mais um golo e não marcámos nenhum. Oh well...

Madi - Olha, aqui está um tipo que podia jogar à direita em vez de médios centro! No entanto, até acho que este lugar de avançado móvel lhe assenta melhor. É que assim não tem que cruzar tanto e...nota-se menos *wink* Se - SE! - evoluir muito - MUITO! - bem, pode ser uma história muito engraçada. Como muitos outros, right? Right.

Rui Barros - Eish, credo, que confusão que para aí vai, Ruizito. Aparece por aqui um dia destes, para uns abafadinhos, e cumbersamos os dois, tá? Combinado.

A minha equipa, neste momento: Baye; Musa, Justiniano, Bidi, Oleg; Luizao, Kelechi, Baró; Macedo, Costa, Queta
...

O adversário de hoje está muito bem nesta divisão, onde há pouca gente a ver os jogos e, assim, podem dispensar-se bancadas em risco de ruir. Ganharam, mas era muito bem feito que tivessem perdido. Inchem!

De qualquer maneira, apesar da embirração, obrigadinho pá, por nos terem torcido o pepino logo de inicio. De pequeninos.

...

E agora, alça este belo rabito para Vagos \m/. Tomem conta do Dragão e peçam desculpa à equipa pela minha ausência. Ao Sérgio não precisa que ele sente-se aliviado.



 


quarta-feira, 13 de junho de 2018

To Russia, with faith e fatos bem catitas



Adoro Mundiais. E Europeus. E a Copa América. E o CAN. Quando aconteceu ter licença de paternidade, fiquei todo feliz por ter calhado num janeiro. Segui atentamente a competição Africana, torcendo pelo Mali - eu e o rebento - muito antes do advento Marega. Aliás, tão concentrados em ver os jogos estávamos que nem demos pela queda da pirralha do sofá abaixo. nem eu, nem ela, que ainda demorou uns segundos a berrar, para meu absoluto pânico. Pai do ano, naturalmente.

Já se vê que estou em véspera de me babar abundantemente com o Mundial da Rússia. Abre logo em grande estilo, com um anfitrião vs. malta das burcas. A Europásia contra o Médio Oriente, gás com fartura versus petróleo em barda. Na primeira fase é que há os jogos mais suculentos, como o fantástico Austrália / Islândia, o épico Panamá / Tunisia, ou o clássico Japão / Senegal.

E também há outros igualmente interessantes, embora menos coloridos, como o confronto Ibérico de quarta-feira.

...

Por falar em nosotros y nuestros complicados hermanos, diga-se que chegamos a esta competição com um estatuto inédito: somos Campeões da Europa. Isto é, os maiores de entre boa parte dos muito grandes.

Eu cá acho indecente fazerem isto ao Passos Coelho e ao Portas e aos ministros deles. Então andaram os moços, e o país a reboque, a clamar aos quatro ventos que não senhor, nós não somos a Grécia, para agora estarmos para o Rússia 2018 como os Gregos para o Alemanha 2006. Ai, espera, esses nem chegaram a qualificar-se para o Mundial. Ufa, lá se safam Pedro e Paulo. Nós não somos a Grécia. Para grande tristeza da Catarina que já se estava a ver vizinha do Tsipras, mas do Alexis, o de esquerda, o à maneira, não o que ele depois se tornou, à conta da burguesia e assim, nem a Mariana, toda ela calores com o homem, já lhe pega.

Por acaso, é curiosa a comparação, sendo que a Grécia não é famosa pela sua expansão marítima, mas nem por isso deixou de ter os seus períodos áureos de escravatura. Ah poijé, bebé Catarina. e acrescente-se a exploração sexual desde idades bem tenras, em passeios pelos campos, mestres filósofos e seus tenros aprendizes. Justiça se faça, e por aí pode a Catarina descansar, era malta muito pouco chegada a heterossexualidades. Enfim, como diria Sócrates, só sei que o Carlos Santos Silva é que sabe. Ou assim.

Fica então estabelecido que não somos a Grécia e, pessoalmente, creio que vamos abrir a competição com uma vitória, só para contrariar o esperado empate. Se não estão a contar connosco, pois deviam. Os franceses é seguro que estão. Não há Eder, mas temos um Guedes com orelhas de abano prontinho para ajustar umas contas. Merci.

...

Em A Culpa é do Cavani, escolhi apoiar a Nigéria, como segunda equipa. Os resultados, até ver, são espantosos. Ainda mal se sabia que eu era pela Nigéria e já estavam os millones a entrar. Sete ponto dois milhões, mais exatamente. Deve ser patrocínios à minha conta e isso. Ou então venderam o Etebo, uma delas. Vocês sabem que eu aprecio o moço, e torço para que faça um belo Mundial, mas quero mesmo, é ver quantos destes milhões serão investidos para o clube aqui das traseiras de casa fazer um campeonato tranquilo.

De resto, no que diz respeito às fatiotas, já ganhámos de goleada! Se pensam que ironizo, estão muito enganados. É confirmarem vocês mesmos. Só é pena ser em verde, mas nós bem sabemos que a escolha das cores das bandeiras é um mistério insondável. É olhar para a nossa. Também não tem muita graça que sejam conhecidos por Super Eagles, que parece nome de grupo organizado de adeptos. De qualquer forma, não consta que sejam perseguidos pela PJ, o que já marca uma enooooooorrrrrmeeeee diferença.

...

Ora bem, então temos aqui o Tugão a correr por fora para Campeão e a Nigéria pronta para ser batida na final. Mas diz que há gente que não sei o quê os favoritos. Ora bem, se é para não perceberem nada de bola e dizerem o mesmo do que os outros todos, então a lista de favoritos, aqui na Tasca, fica ordenada assim:

1. Brasil
2. França
3. Alemanha

Eish, tudo malta que andou a dar forte na escravatura, credo.

E broxelências, quem é que acham que limpa o caneco?

...

segunda-feira, 28 de maio de 2018

O Corpo de Deus

- Valha-me Eu Mesmo, que desperdício de
Livre Arbítrio, credo. - Abana a Grande Cabeça, um tanto incrédulo, um tanto desiludido. - Sinto uma ânsia cada dia maior de corrigir este pequeno erro. 

- Passou ainda muito pouco tempo, Senhor. Somos uma espécie muito jovem, é natural que sejamos parvos. - Tenta amenizar, o factor corporativo a falar mais alto.

- Talvez, talvez. Não deixo de sentir que correria melhor se tenho apostado nas centopeias. - Cofia as barbas. 

- Argh, Senhor, tão feias, cheias de patas. Olhe a experiência em Znodar... - Arrisca.

- Que tem? Já viste as gavetas das meias e cuecas dos Znodarianos? Im-pe-cá-beis, pá!

- Vai-se a ver é porque não há assim muitos Znodarianos... - Entre dentes.

- Kié? Outra vez isso de ficarem sem a cabeça à primeira queca? Um detalhe, Pedro, um detalhe. Para além de que Louva-a-Deus é um nome muito feliz para uma espécie. Eu acho. E olha, não sei, mas cá pra mim, os teus amiguinhos lá de baixo não andam longe de pensar que isso é boa ideia. Equidade a sério é ser a fêmea montada à canzana, para nem ter que ver o macho, e quando estiver assegurada a continuidade da espécie, zás, arranca-se-lhe a cabeça à dentada. Aposto que ainda aprovavam uns subsídios para isto. - Esboça um sorriso.

- É a juventude, Senhor, verá. E talvez pudéssemos usar outros termos. - Olha em volta, preocupado. - Não é lá muito boa altura para dizer macho e fêmea, é um bocado confuso. Coisas de jovens, já se vê.

- Mas foda-se, oh Pedro, em tão pouco milénio já fizeram merda de caraças, não? Não há paciência. E depois é esta soberba que não se entende. Consideram-se tanto e tão e tudo, que lhes parece sempre adequado perderem tempo com as merdas mais inimagináveis. Vou é acabar com as subtilezas. Ai agora um maluco no poder a ver se entendem, ai agora umas catástrofes naturais a ver se acordam, e nada. Nadica! Uma praga é que vai ser. Manda-se os de Znodar invadir aquela trampa e comer-lhes as cabeças a todos. A eles e a elas e aos entretantos, a ver se não acham logo estupendo serem os géneros diferentes.

- É isso que o irrita, Senhor? A sério? - Indignado. - A fome, a guerra, as criancinhas, a Maria Leal a cantar, enfim, toda uma cornucópia de desgraças a pedirem a atenção Divina e é com isso que se preocupa? 

- Pois claro! Eu tenho um Universo para manter em equilíbrio. Lá tenho tempo para pormenores? Agora, o género é um factor crítico da Criação. E o Criador sou Eu!

- É um pedacinho culpa Sua, havemos de convir. - A muito medo. - Com essa coisa de “à imagem e semelhança” e da Santíssima Trindade, que é 3 em 1, melhor que o champô das estrelas de cinema. É sempre Ele, o Senhor? Se sim, como é que Ela é “à imagem e semelhança”? E a mulher do Zé? Pelos vistos a Mãe não era da Trindade. Não parece lá muito equitativo em termos de género, não...

- Muito engraçadinho, o senhor Pedro. É pena o cancro terminal que o manda da Vida Eterna para melhor, não é?

- Hã? Isso pode-se? - Em pânico.

- Pergunta parva, hein? Mas não tenhas medo, com a dificuldade em arranjar criadagem em condições nesta Eternidade, desculpo-te mais esta, oh pescador. Pá, à imagem e semelhança é uma metáfora. Também é sabido que Sou todas as coisas e não vês malta a defender o direito de se sentir uma bolota, apesar de ter sido batizado Maria, pois não? E não me apetece agora falar disso do Espírito Santo ser Pai de Si Próprio. Foram tempos complicados... - Pensativo. - Caramba, não me rala que se engalfinhem por qualquer disparate e que se ponham a discutir pintelhos até à exaustão, mas pilas são pilas e con... - Interrompido:

- Senhor!! - De olhos muito abertos.

- Ora Pedro, queres que lhe chame o quê? Senaita? Rata? Pipi? Isso é que são lindas palavras, é? Opá, fartinho até aos colh... - Interrompido:

- Senhor!!

- Enfim, como se fazer a luta pela igualdade fosse igual a abolir toda a diferença. Como se o primado da tolerância pudesse ter raiz na intolerância ao contraditório. Cansado, eu estou.

- Pois, está claro que eu sou um mero Santo, não posso compreender o Grande Plano Cósmico na sua infinita totalidade, mas ainda assim, que não sei, pensei que o preocupava mais a Eutanásia do que quem é que é contra rapar as sovaqueiras e outras pilosidades quejandas.

- Qual Tânia? Não conheço nenhuma Tânia, era concerteza alguém muito parecido comigo. Nunca lá estive. 

- Não, Senhor, não é Tânia nenhuma. É aquela coisa do suicídio assistido, da morte programada.

- Naturalmente, Pedro. É sempre programada. É nascer que já se fica logo com ela agendada, qual é a questão?

- Ora, Senhor, o direito sobre a Vida e a Morte é só Seu, não podem agora os vivos, ou os mortos, para o que importa, virem decidir se... - Detém-se perante a grande manápula levantada.

- Quero lá saber! Morrerão, assim tenham nascido. É esse o Meu Desígnio, nada mais.

- Mas...mas... a Doutrina... é sabido que é Pecado Mortal porem-se as pessoas...

- Poupa-me pá, não me metas nessas picuinhices. Aiai que isso é Eu que mando e ninguém mais mete a pata, vai já tudo para o Inferno, sem passar pelo Purgatório e receber dois contos, se não for Eu a mandar. Vais quinar anyway, mas só quando eu disser, pumbas bem feito. Soa um pedacinho a falta de confiança, não? Parece a Divindade que tem que ser um ditadorzeco no trabalho, para compensar a porrada que leva em casa e isso tudo. Eu Sou. Ponto. É quanto basta. E estou muito abatido de vos aturar, mais aos vossos disparates. - Deixa cair a cabeça entre as mãos.

- Pronto, pronto. - Passa-Lhe um braço pelas costas. - Também precisa de se distrair um bocado. Olhe, aproveitemos o feriado e vamos fazer qualquer coisa diferente. Sei lá, criar uma nova espécie ou assim.

- Feriado? É feriado de quê?

- Corpo de Deus, Senhor.

- Hã? Mas se Sou incorpóreo! Como assim o Meu Corpo? Era o que faltava! Ainda me meto numa série de chatices por ter as pernas depiladas à conta de andar de bicicleta ou assim. Nem pensar, quais Corpo de Mim quais carapuça!

- É o que diz aqui, Senhor, eu não tenho a culpa.

- Gafanhotos. São amorosos, os gafanhotos, mais aos seus saltinhos. Upa, upa, poing, poing. - Salta á roda do outro. - Não achas, Pedro?

...

terça-feira, 15 de maio de 2018

Os olhos e os óculos

Lamento, mas existe uma probabilidade estatística não negligenciável de que sejas menos bonita do que te vejo. Embora seja certo que não te minto e que te olho. Ainda que me afaste, posto nos meus óculos já progressivos, com as mãos atadas atrás das costas, impossibilitado, portanto, de acrescentar tato à visão, és-me assim tão linda. Está claro que me recuso a enfiar um saco de plástico na cabeça, com buracos rasgados por altura das vistas, ainda que disso beneficiasse a exatidão do resultado da experiência. Anularíamos o efeito do olfato, esse sentido primordial, animalesco, que me traz no teu cheiro a minha casa. Por outro lado, correria o risco de asfixia o pobre sujeito posto à prova. Um teu criado. Recorramos a uma mola, pronto, que me vinque o nariz a bem da ciência. Sendo seguro que a esta segura distância não te provarei, espetem-se dois tampões nos respetivos ouvidos, não vá à tua gargalhada estragar os pressupostos do ensaio, e teremos anulado todos os sentidos, exceto esse de ter olhos e ver. 

Se uma comissão de estudo, um conselho de sábios, uma máquina espantosa, uma nova tecnologia alienígena, puder comprovar que te vejo mais bonita do que aquilo que és, então é porque tenho as portadas escancaradas para um pátio em Aboim, onde um ruminante improvável pasta os arbustos rentes ao muro. De dentro do quarto, a minha Alma vê-te passar, lenta, lânguida, descendo a estrada - será um caminho de terra batida? - em direção ao terreno da festa. Uma coluna presa ao poste de iluminação pública, virada diretamente para os meus ouvidos, debita - ainda não deram as sete - Avés a esta Maria, Senhora do lugar e das Almas que se atreverem - oh tu, meu pobre - a olhá-la através das suas janelas. Tão bonita.

...

Sou-te assim honesto, porque me debato com a irremediável dissonância entre Eu na minha mente e Eu no meu espelho. Nosso.

Regressemos aos meus óculos. Esses que uso para trabalhar, que têm uma griffe que agora não me lembra, à conta de uma promoção qualquer na compra das lentes. Como se tivesse sido imprescindível mudar as vidraças e, nesse caso, já se aproveitou e trocaram-se também os caixilhos.

Ponho as lunetas e o meu cérebro diz-me Clark Kent, intelectual sexy, maduro ma non troppo, os olhos meramente cansados de tanta letra, fantásticos poemas, donzelas arrebatadas, horas de estudo aturado dos Grandes Mistérios, hmmm disse sutra, cavalheiro com o seu ar Nespresso, what else?

Posso tirar a camisola, certamente, e deixar arejar os peitorais e o abdómen desinchado, talvez possa reparar nos pequenos traços dos músculos costais, e passear-me assim, os meus soberbos óculos nas ventas, pela casa, ao calhas. Quem sabe nos cruzamos no corredor, tu incauta, eu irresistível, o gato por entre as nossas pernas.

Pelo caminho o maldito espelho. Em dependendo do comprimento das barbas, um velhote de óculos ou um labrego em tronco nu.  E lá nos chocamos, inevitáveis, a meio caminho da casa de banho, tu compenetrada, eu um urso, o gato a exigir que o sirvam.

Deve acontecer, porque é uma regra implícita da tendência do Universo para o equilíbrio, que também tu sejas múltipla. E eu guarde nos olhos apenas a verdadeira. Tão bonita.

...

Deste desequilíbrio da beleza entre nós, resulta uma meia-verdade insofismavel, como os atrasos da ferrovia portuguesa: podias arranjar melhor. Só meia, porque mas.

Olha, logo para primeiros, podias enrabichar um moço novo, todo ele photoshop, passa-lhe uma pessoa a mão e nada se gelatina, tudo rijinho - não seja porca, minha senhora - tudo definido como deve de ser. 

Mas ías acabar a rir-te comigo, numa visita esporádica em nome dos bons velhos tempos, da pressa desajeitada, do fôlego mecânico, do tédio de não saber aproveitar o tédio. 

Os meus pés sujos da terra ocre, estendidos para fora da sombra do alpendre; o escuro do interior da casa, onde as moscas se refugiam do calor, a contrastar com a alvura do teu vestido de linho. Depois ias dizer “mas a pessoa passa-lhe a mão...” e eu ia disparar pelo caminho colonial mal alcatroado, montado numa motocicleta, direitinho à liquor store em Hikka. No portão, o teu vestido esvoaça numa última gargalhada que a velha empregada desdentada partilha - como se percebesse uma palavra, raisparta a mulher - e guarda no sari gasto. Voltarei mais cedo e menos bêbado do que o aconselhável para o aumento da tensão dramática, a velha terá feito biryani de galinha, com vegetais cortados muito miúdos, como tu gostas - como raio podia saber? - e condimentado na medida certa de uma Lion lager. Comeremos os três com as mãos, no quintal, e tu anunciarás que tencionas prolongar a estadia, ao que ripostarei, implacável, que não podes ficar mais do que cem anos.

Um século depois, encaixados na rede pendurada das palmeiras, dir-me-ás ao ouvido, afagando o meu peito enrugado, “uma pessoa passava-lhe a mão e tudo o que lhe apetecia era o teu caril de frango”. Felizmente, comprei a liquor store de Hikka ou teria que ir afogar a raiva para a dependência de algum banco. O progresso, como nas lentes dos meus óculos. 

Antes de a motorizada desaparecer no pó da curva, ouvirei o anúncio da Toda Poderosa: fico só mais cem, não vás esquecer-te de alguma data importante.

...

Eu bem sei que é fraco argumento, este de combater estupendos abdominais com especiarias. Mas é só porque as pessoas tendem a não perceber a importância do picante na língua. O modo como ela procura apaziguar-se em paladares doces, texturas macias, como se fosse absolutamente necessário desfazer as camadas de uma fatia de bebinca uma a uma. Na boca. Liquefazendo-se. 

Tu não subestimas estas indiossincrasias orais. É uma vantagem nossa, dos que nascem com a língua a arder, que tenciono utilizar em meu favor. E em teu, sempre que me der sede. Não me vou agora por a mudar uma equipa que ganha consecutivamente há tantos campeonatos.

...



segunda-feira, 7 de maio de 2018

Só assim! (outra carta ao Dragão Vila Pouca)



Grande Dragão Vila Pouca,

Podia mentir e dizer que foi para si um dos meus primeiros pensamentos, no eclodir da - yet another - festa, desta nova vitória, em mais um momento de libertação, como se uma nuvem cada dia mais negra deixasse de pairar sobre as nossas cabeças. Em cima de cujas o céu, afinal, nunca caiu. 

Não foi dos primeiros, foi até dos últimos. Numa sequência interrompida por outros pedaços da Vida, o coração a fugir apertado para os lados de Águeda - é outra história - e a correr transbordante de alegria para a nossa casa, o nosso Dragão. Todos vós enchendo o ecrã que teve que ser a minha janela para a alegria, essa que eu, perdoe a imodéstia, merecia tanto ter partilhado. Mas o que importa é que se deu, conforme previsto, conforme necessário, porque nem sempre a injustiça de uns homens se sobrepõe ao mérito de outros homens.

Às tantas, numa linha de raciocínio que é certo que envolveu cânticos e alguns abraços; que deve ter passado por muitos lugares e outras tantas pessoas; que é muito provável que tenha incluído belas mamas - só porque sim; lá cheguei a si. Salvo seja, que de mamas o meu amigo é uma vergonha. 

Certo é que tanta curva e contracurva das sinapses - juro-lhe que por vezes as oiço rebentar - cheguei a uma espécie de palco elevado, uma coisa em redondo, toda ela engalanada de azuis, como não podia deixar de ser. Nessa clareira da mente, nesse sítio onde se concluía, definitivo, aquele pensamento, entre os pulos e os gritos dos nossos heróis, eles próprios feitos adeptos, imbuídos da nossa alegria, afinal apenas mais umas dezenas no mar dos milhares que os rodeavam, como há muito - horas de vitória incluídas - não via, nesse exato instante em que mais uma sinapse fez pum e foi fogo de artifício sobre o viaduto, o silêncio repentino disse-me: Só assim!

Só assim era possível. Só passando por arbitragens como as da Feira, de Vila das Aves, de Moreira; pelo desrespeito em nossa própria casa, a mesa posta para os convidados, gostemos ou não deles, por obrigação desta educação antiga - diz que somos regionais e pequenos - quando nos impediram de ganhar ao 5LB; pelos erros próprios em Paços; pelas dúvidas existenciais do Restelo; só vivendo o momento de afirmação, sustentado numa crença inabalável, de vencer no covil do inimigo; sempre mantendo a par a luta lá fora, pelos poucos meios de que dispomos, e a raça, a emoção, os golos dentro do campo; só assim seria possível. Só assim! 

Quando me dava por contente pela minha conclusão, dei consigo. Lá estávamos, encostados ao murete em frente da porta 4. Os anos tinham andado um pouco para trás e fazia Sol, mesmo que não lhe possa já dizer se era Verão. Como sempre, eu defendia uma postura de recato, de competência e retidão, sem chafurdar nas lamas que tão claramente já vislumbrávamos. E estava artilhado de argumentos para todos os gostos, desde a nossa posição hegemónica - da qual você já duvidava basto - que não nos permitia ser guerrilha, até à superioridade que eu notava em campo, com a posse e o passe e uma cultura de equipa tão grande que já não me parecia caber num país tão pequenino. E mesquinho.

Isto não é Inglaterra, Silva! Se continuamos com esta postura mansa, somos comidos. Mas fazer barulho não chega, é preciso que lá dentro, no campo, as tropas consigam vitórias. Senão tudo esmorece. Este Clube foi feito de sangue, suor e lágrimas. Só assim, Silva, só assim!

Só assim, Vila Pouca, só assim. Obrigado.

E agora, estou aqui a matutar. Será que esta retumbante vitória nos deixa mais próximos de ser Inglaterra? Era bom, não era?

Um grande abraço, Campeão.

Silva

...



sábado, 5 de maio de 2018

Árvores frequentes, por Tininho Silva (com preâmbulo do tasqueiro)

Preâmbulo

É necessário que compreendam que o tio Deolindo era um homem bom. Nessa aceção que estão agora mesmo a fazer, mas também naquela outra que nós, homens antigos, comummente reservamos para as mulheres. Boas. Isto é, o tio era um tipo bestialmente bem parecido, coisa que aparentemente corre na família há gerações e não se crê estar a ponto de deixar de correr. Se pensarem que dentro desse corpo bem nutrido e torneado, com janelas nos seus olhos negros e expressão máxima num sorriso franco e fácil, morava um verdadeiro pinga-amor, rapidamente concluirão que partia corações com a mesma facilidade com que o bom do Yacine parte rins.

Quem não se habilitava a deixar que lhe partissem o coração, era a minha tia. Eita, mulher rija e de convicção arreigada. Ainda hoje. Sempre foi tacitamente aceite que sobreviveria ao seu esbelto marido, tanto quanto não restam dúvidas de que este sempre lhe seria - e foi - caninamente fiel. Apesar de tudo. Digamos que era uma alma de caçador, sempre atento, à espreita, incapaz de resistir ao thrill of the chase, mas no fundo - e nos momentos de todas as verdades - um vegetariano da melhor estirpe. Exceto em casa, como comprovam os meus muitos e parecidos primos e primas. Ainda que de todos, apenas um seja mesmo, mesmo meu primo de coração.

Assim será mais fácil entenderem os risinhos aparvalhados da menina do guiché do Registo Civil, assim que pousou os azuis olhos no mancebo - pareceu novo até morrer de velho - que lhe sorria do outro lado do vidro. De tal maneira que nem reparou no olhar fulminante da senhora, criança ao colo, que acompanhava o dito cujo. Abençoada de mamas, mas fraquinha da inteligência, a moça era toda mãos a alisar o cabelo e a puxar o decote até onde podia e ih ih ih diga-me lá o senhor ao que vem.

- Pois registar aqui o catraio, já se sabe.

- Ai tão novo, nem idade tem para ser pai. Ih ih ih. E que nome lhe quer dar a senhora sua sortuda? Perdão, digo, esposa. Ou nem tanto? - A esperança a encher-lhe os olhos e a inchar-lhe o peito. Para fora do decote.

- Tininho, tininho nessa cabeça, minha menina. - Instou a tia. O tom gélido que sempre conseguiu empregar, deixava-nos a todos em sentido, fosse por ser demais a correria ou hora de dormir. Já. Sendo que para se sentir tamanho receio, é imprescindível ter mais dois dedos de testa do que esta rapariga do Registo Civil. É atentar na resposta:

- Nessa Cabeça? Isso é o apelido?

- Não, credo! O apelido é Silva, pois então.

- Ah, muito bem, minha senhora. E desculpe qualquer incómodo. Para a compensar, aqui tem com a maior eficácia possível e jamais vista, a Certidão do seu menino. Vosso, maldita sorte.

- Como assim? Nem o nome lhe demos. - Disseram, balbuciando em uníssono, os meus queridos tios.

- Naturalmente que disseram, como se pode bem ver pelo preenchimento da respetiva Certidão. Aqui está, leio-vos:

Nome próprio: Tininho
Apelido: Silva

Os tios entreolharam-se de espanto, a menina disse:

- Queriam que fosse Da Silva, era? Haviam de ter feito o reparo em tempo útil, agora está o cachopo registado.

É deste modo que o meu primo, ao contrário do que muitos pensam e outros tantos especulam, não se chama Catarino, nem Albertino ou Tino, simplesmente. É mesmo Tininho o nome dele. É um melómano. Característica que o habilita a ser o crítico de música residente da Tasca, por muito que o senhor Monteiro da Silva o olhe um tanto de lado. Enfim, o Monteiro tem a sua razão, mas há sempre alturas em que o sangue fala mais alto.

...

Review de"Often trees", Blind Zero - por Tininho Silva

Em mãos, na verdade em ouvidos, para sermos completamente honestos, o muito aguardado segundo álbum dos portuenses Zero Cego. Sucessor do raivoso, um tanto grungico - quase obrigação da época em que foi lançado - e pearlajamado "Trigger". Apesar de que o escriba terá seguramente ouvido mais faixas deste primeiro opus do Zero, do que de todos os discos do Guedes wannabe, Veder. Acho eu que é assim que se chama. Ou então é Vader. Um deles. E sejamos francos, havia naquelas guitarras e nas vocalizações, uma vontade intrínseca de ser Metal. Um sinal muito positivo, a aguardar confirmação.

Comecemos pelo principio a análise a este "Árvores frequentes" - para título, não faz lá muito sentido, mas os artistas, enfim... - que é como quem diz, pela capa. Na categoria "discos com assentos na capa", podemos dizer que apresenta um sofá bem catita, todo ele em capitonê. Daqueles em que dá gosto a pessoa ficar refastelada, a ver o FCP a ser campeão. A arte trazer uma reminiscência do Dragão não está nada mal para inicio.

Está claro que não cometeremos a injustiça de nos pormos a comparar com outros lançamentos, igualmente com repouso para o traseiro na capa. Aos homens o que é dos homens, aos Deuses o que é dos Deuses. E não estou a falar do mê primo, mesmo que os WC Toillete - conjunto do qual tive a felicidade de participar - tivessem passado ao lado de uma grande carreira. Penso que foi do 33, para o Campo Mártires da Pátria. Era daqueles com lagarta no meio, grande para caraças. Há outros assentos que, mesmo se menos convidativos, habitam o Olimpo da descarga elétrica e com os quais mais vale não competir. Tipo, são o FCP dos discos com coisas para a gente se sentar na capa. E vêm em azul e branco e tudo, os maganos.

A minha grande dúvida em relação aos Zero, sempre foi qual o caminho que tomariam, dos vários que o anterior trabalho - Trigger - deixava antever. Libertar-se-iam das amarras da época e deixariam as guitarras conduzi-los por uma jornada revivalista pelos bons velhos 80s, sendo nomes maiores da New Wave of Traditional Heavy Metal? Ou acabariam seduzidos pelo éter e pelas moças bem boas de mamocas ao léu, às cavalitas dos seus namorados de ocasião, nas grandes arenas deste Mundo, e liderariam o movimento Hair Metal / Glam Rock, tão fracamente representado no nosso país? Lá hair tinham os moços com fartura. Sem verbalizar, suspeitava que nem uma, nem outra. Havia ali um laivo de intelectualidade que me deixava de pé atrás. Cá pra mim, aquilo ia dar um post-punk caviar ou derivar para o lado progressivo. Mais Dream Theater do que Zé Cid, está claro. Mas quais Procupine Coiso qual carapuça, deixai as árvores em paz, chiça!

Afinal, foi-se a ver, nada. Isto é, nem para uns lados, nem para os seus inversos. Ou então tudo, depende do ponto de vista. Condicionado por uma série de protótipos de disco destes cachopos que fui ouvindo, predispus-me a passar meia hora, mais os descontos de um jogo dos lagartos em Tondela, a maldizer as músicas e os autores e a minha vida e isso tudo. Como não sangrei do nariz depois de ouvir o disco uma vez, ouvi mais duas, a ver se me convencia da bela trampa que de lá tinha saído, pois os tipos continuam a insistir em não fazer aquilo que fariam melhor: Metal. E nada. Acabei soterrado ao peso de ter gostado, genuinamente, de muitas das canções. Pronto, algumas. Raios, mais do que era suposto, se queria escrever um post com piada para a Tasca. Dei por mim a pensar: estes rapazes haviam de gostar dos últimos álbuns dos Ope... naaaaa, deixa lá os elogios para o fim.

As músicas:

Lake, Escape (isto tem um feeling 70´s que lhe fica a matar), Palm (lake reprise?). Até o Still Loving You - sim, todos os discos têm o seu - resultou muito bem, sim senhor. Chama-se Won e aposto que passou na rádio. Estas são as boas. A muito boa merece o nome completo: The Siren

Há maijumasquantas, como diria o mê primo, porque isto dos discos compactos e das pen e assim, é coisas muito grandes que levam muita tralha e os conjuntos vêem-se gregos para encher aquilo. Se calhar foi por isso que estes fizeram também uma K7. A fita cai muito bem ao som orgânico - tem instrumentos a sério este disco, pois tem? - que percorre todo o álbum,

No fim, não sabia bem se me apetecia ir a correr ouvir o Big Brother ou se sucumbia ao elogio maior à obra. E confessava que me lembrei mais do que uma vez que há algum tempo que não ouvia...


Stay heavy  \m/
Tininho



terça-feira, 1 de maio de 2018

O homem no Castelo Alto


Nunca lhe foi confortável a exposição. Habituou-se, é certo, como nos habituamos às coisas inevitáveis dos nossos dias. Ainda assim, o rumor da turba lá fora, os cânticos, o seu nome repetido vezes sem conta, continuam a deixar-lhe a barriga fria e as orelhas quentes. Em seu redor há um alvoroço de camareiros, de assessores, estrategas, peões de brega e outro povo miúdo que desconhece em absoluto. Não aumenta o ritmo nem diminui o passo, faz o corredor inteiro à mesma pouca velocidade, sem gritar uma ordem, sem dar uma palavra, limitando-se a receber papeis anotados, post-it amarelos rabiscados, muitas palmadas nas costas e um ou outro suspiro contido de alguma secretária invisível. De vez em quando, responde com o "hum-hum" que lhe é característico. Os poucos que o conhecem de facto, diriam de imediato que está nervoso.

Abrem-lhe uma porta, passa o limiar da confusão e está, por fim, só, na ante-câmara dos seus aposentos privados. Exceto pelo mordomo surdo e mudo e cego. Faz soar o seu sininho e, em menos de um fósforo, a divisão alberga o Estado Maior. É com eles que assomará ao varandim.

...

Ocupando todas as faixas da imensa avenida, as varandas de todos os edifícios, os passeios, os tejadilhos dos automóveis, as copas das árvores, os terraços e os telhados, o Mar Vermelho saúda a uma voz o Líder Imortal. Logo abaixo do varandim, por dentro do cordão policial, os altos dignitários da Nação prestam, ainda outra vez, homenagem ao orgulho da Pátria. As forças de segurança, ainda um tanto confusas - ainda agora estavam convencidas de que seria uma detenção e logo se tratava apenas de policiamento da festa - pugnam para que a paz prevaleça. 

Na primeira fila do Povo, os intelectuais notáveis, os políticos anónimos, os autarcas comuns, os artistas de várias castas e diferenciadas qualidades. De cada lado da avenida, um palanque. O da esquerda mais engalanado, o da direita menos elegante. Neste, apinham-se os jornalistas, com e sem carteira, as câmaras de televisão, os microfones das rádios, circulam charros, bebem-se cervejas, canta-se, pula-se, abraça-se. Ah, a alegria no trabalho. No da esquerda, alinham-se marciais as medalhas dos diversos ramos das Forças Armadas, os juízes, os oficiais de justiça e duas ou três prostitutas, das mais finas.

O sorriso sai-lhe franco por debaixo do bigode. Ei-lo, o seu Povo. Há um arrepio, mais de alívio do que de emoção, que lhe percorre a espinha. Oh sim, ele sabe, hoje aclamado, bajulado, levado em ombros, se deixasse que o tocassem. Amanhã, arrastado, amarrado à traseira da primeira carrinha de caixa aberta, pelas ruas da amargura. 

Mas isso que importa agora? À sua frente derrama-se a fundação e o sentido de todo o seu Poder. Felizmente, não têm a mínima noção, os pobres ignorantes. Ou fazem por não a ter, o que dá igual, senão ainda melhor. Ao vê-los assim, eufóricos, apaixonados, embevecidos perante o Guia de todas as Vitórias, sabe que os próximos tempos serão tranquilos. 

Bem-vinda que será alguma calma, tão conturbado e periclitante foi o passado próximo. Ora, próximo que tenha sido, não deixa de ser isso mesmo: Passado. E acena à multidão que entra em delírio.

...

As notícias que lhe chegam da Zona Livre são francamente animadoras. Como era inevitável, mais uma batalha perdida aprofundou as cisões, a contestação subiu de tom, aparentemente não há quem se entenda. Reconforta-se nestas novidades, por oposição ao que suou nos dias em que o vislumbre de uma derrota lhe anunciou o esboroar do Império, a implosão das fundações do edifício, enfim, o Fim. Pior que isso, o principio do Fim e não o derradeiro suspiro, a morte súbita. Antes os primeiros passos de um longo e tenebroso calvário que em vez de um mártir fulminado, o tornaria um pária indesejado. Lembra-se:

- Oh Domingos, hum, hum, e essa coisada dos filmes? Está resolvida? Hum hum?

- Nem por isso, meu caro, nem por isso. Apareceu mais um. Não entendo, parecem tirados de uma qualquer realidade paralela. Percebes alguma coisa disto, Luís?

- Hum...hum...

...

Another one bites the dust!


...

Com a devida vénia ao inigualável e eterno talento de Philip K. Dick

domingo, 22 de abril de 2018

A lista de compras do senhor Monteiro da Silva

Procrastino no penúltimo cigarro, as luzes já apagadas, a mente à procura de desculpas plausíveis para deixar as limpezas para amanhã. Acordar às quatro, ter isto aberto às seis e vinte, não tem que estar sempre um brinco, correr com a malta mais cedo, ver-vos antes de dormir.

Predisponho-me a acabar o dia neste copo que sobejou da melhor garrafa que hoje se vendeu. Sorrio-me da lembrança do Berto Faz-Tudo a sair atrás da rapariga dos olhos claros, as mãos apertadas dentro dos bolsos, o puto em cabriolas à volta deles - oooh Marega, ooooh Marega - ela a olhar para o balcão antes de atravessar a porta, ele um lagarto resignado, o miúdo um alvoroço só. Cinco alvoroços. 

Chegamos a um compromisso, me, myself and i: limpamos as mesas, deixamos a máquina a lavar, enxagua-se o chão e o balcão pela manhã. E a cozinha. Damn.

Imagino-te a apreciares-me, a traçares a rota mais simples e eficaz para a recolha da louça, a minha rotação tropical gingando entre cigarro e copo, os nervos a eriçarem-te os pelos do braço, um assomo de alívio quando saio do balcão, os olhos espreguiçando-se pela sala. E lá vou, um Brahimi de chávenas e canecas e pratos, serpenteando pelo caminho mais difícil e improvavel, mais bailado do que trabalho. Ah sim, meu Amor, tudo é arte, tudo tem a sua estética. Upa, um pires pelo ar, meia pirueta, agarra-o com a outra mão. Às vezes partem-se, mas eu não te conto.

...

Na mesa do senhor Monteiro da Silva, uma folha arrancada do seu bloco, esquecida:

Lista de compras
  • Azeite
  • Alhos
  • 1 polvo (grande)
  • Alfa Semedo
  • Batatinhas (assar)
  • Salsa
  • Lucas Evangelista
  • Colorau
  • 1 cebola (pequena)
  • Renato Santos (?)
  • Guardanapos
  • Queijinho seco
  • Calleri
  • Não esquecer: Palmas desceu
...

Em casa, tu obrigar-me-ias a trocar a salsa por coentros. Mas o que mais estranho, é porque raio quer ele colorau para fazer Polvo à Lagareiro?

...


sexta-feira, 20 de abril de 2018

hiperligação | 92º shooter: opus XI - traição



«traição!», bradou ele. e desatou numa correria desenfreada, qual fuga para a frente, rumo a um local incerto e que só existia na sua mente.
como chegara ali e àquele ponto, isso agora não interessa para nhaga, porque são contas de um rosário que não vale para este totobola.


diz quem viu que foi tudo contra-natura. e, como contra factos não há argumentos, ninguém se conformou. ainda hoje está muito difícil o consenso, aliás, daí um silêncio surdo e muito mudo sobre o sucedido - o que não significa que a “bolha“ esteja prestes a rebentar…
afirma quem não presenciou - que também os há - que nunca se viu algo assim, nos últimos tempos. que tudo se compeliu em direcção a uma catástrofe que, de tão evidente que era e que facilmente se percebia, só quem nela participou é que estava ceguinho de todo. «e isso é inadmissível», acrescentaram.
quem não compreendeu nada do que se estava a passar à sua frente e até já tinha deitado tudo para detrás das costas, ficou ainda mais paneleiro dos olhos porque nem queria acreditar no que se estava a precipitar em sua direcção - logo ele que até já tinha previsto alguns cenários, mesmo que hipotéticos.
quem tinha a responsabilidade máxima de dizer alguma coisinha, por mais singela que fosse, tal como o tinha feito num Passado recentíssimo, ficou pior do que um boneco de cera num qualquer museu da cidade - porque estes, ao menos e a bem da Verdade, ficam s-e-m-p-r-e calados para o público que os visita, dado que sabem que há silêncios que são de ouro.
quem adora botar faladura nestas ocasiões e invariavelmente em sentido contrário, adorou (e muito!) aquelas cenas, não poupando esforços em encontrar defeitos onde nunca antes tinha visto uma virtude que fosse; quem gosta de opinar sobre factos viu a sua tarefa complicada porque o que tinha acontecido fora mau - apesar de não ter sido péssimo.


¬ e agora? o que é que vai ser feito de ti?
¬ agora, vou retemperar energias. as necessárias para as finais que se avizinham.
¬ «finais»? plural? mas quais finais?! não perdeste todos os acessos às ditas?
¬ fingi que as disputei. há mais de oito meses que ando em Batalhas de uma guerra só. finalmente chegaram as finais. doze pontos. todo o Céu por esses doze pontos.
¬ que os Aliados estejam connosco!


“disse!“

Miguel Lima | 92º minuto

(este espaço será sempre escrito de acordo com a antiga ortografia. limices.)

quarta-feira, 18 de abril de 2018

Putas e finais, com Eugénio



Sou um tipo derreado. Cansadamente exausto. Naquele estado em que os indivíduos falam para a pessoa e ela lhes acena com a cabeça, enquanto reza aos Santinhos da sua devoção para que não esteja a anuir a propostas de sodomização mútua, envolvendo a equipa de râguebi da Casa de Pessoal dos Estivadores de Mogadíscio. Ainda por cima, tenho sempre azar nos sorteios.

É um fastio muito acentuado desta coisa do “ainda não ganhámos nada”, “a quantidade de pontos que ainda vamos perder”, “we’ll always have Restelo e Paços”, “é com os últimos que vamos deixar fugir esta merda”. Boa parte dos que assim me extenuam, não há uma semana lengalengavam “só a vitória no galinheiro se aceita, nenhum outro resultado pode servir, nunca, é o fim, kaput, game over”. Fartinho debujóbir. 

Portanto, se o FCP não ganhasse, era o fim. Em tendo ganho, muita cautela que estamos quase a perder. Ora fodam-se, sim?

Começo a acreditar que em consequência disto, cria-se aquele mui visto, sempre irritante e mentecapto estado de espírito da final. É tudo finais. O Setúbal em casa, uma final; o Marítimo na Madeira, ui, os penalties de uma finalissima; o Feirense, tremei tripeiros, lembrem-se do que nos tem feito esta autêntica laranja mecânica de Terras de Santa Maria. 

Depois admiram-se que os cachopos pareçam meninos de coro, acabados de chegar ao dormitório do Colégio Militar ou assim. Ai que o adversário, um colossal Vitória de Guimarães de Peseiro - lá está! - nos marcou um golo. Credo, ainda se perde o (yet another) jogo das nossas vidas. Vai ser o fim. Procedamos a borrar-nos todos, dada a trampa que somos. Quanta responsabilidade, quanto peso, quanta tragédia, tanto relógio, tanta pomba assassinada, não quero para mim tanto veneno... Fuck it, já sei que já perceberam, mas eu gosto de citar Eugénio e a casa é minha.

...

Rapazes, nada disso! Estais à frente de um Campeonato arbitrado por Bruno Paixão, João Capela, Luís Godinho, Bruno Esteves e outros camaradas igualmente dados ao sacerdócio; em que disputastes partidas como as da Feira, Moreira e Vila das Aves; em que empatastes a zero com golos ignorados, como o de Herrera, na vossa própria casa - la casa de un hombre es su castillo - contra o todo poderoso adversário; em que errastes clamorosamente como nos ditos Paços e Restelos; e em que resgatastes o lugar que vos pertence por justiça, ganhando orgulhosamente no terreno do inimigo.

Já chega de desconfianças e tremores. Que mais há a provar? É chegada - e já vem atrasada - a hora de encher os peitos e empinar o nariz. São eles quem tem a temer, os pobres Vitórias, os incautos Marítimos, os despromovidos Feirenses, pobres coitados. Abri alas, saudai o Campeão, vinde testemunhar o poder e o brilho do Primeiro! 

Trinta mil mareguianos caralhos vos enrabem se ainda não acreditam, se ainda desconfiam, se acham mesmo que são finais. As finais são apertadas e fechadas e tensas. Parecem nubentes ansiosas mas indecisas. Não é aí que estamos, senhores. Senhor. Sérgio. 

O que somos é o guerreiro cheio de cicatrizes - é certo - que emana o poder das suas múltiplas vitórias, a pele tisnada do Sol dos campos de batalha cobrindo os músculos hiperdesenvolvidos. O matulão de cabelo ao vento, instilando pavor e inveja nos adversários e arrancando suspiros e íntimas humidades às castas donzelas. É isso que sois! 

E agora o herói entra no bordel da terra e é festejado, agraciado, a sua voz incontestada, o seu ouro largado sem cuidado. Ai de quem lhe toque. Não vem para descansar, vem para foder as suas putas, mesmo as que ousarem fingir que resistem. Não são finais, não são nubentes, são o prémio da Glória que fizestes por merecer. Experientes, macias, infalíveis, perfumadas e cheias de tesão. Tomai-as!

...

As coisas quando têm que ser feitas, não há como começar logo a fazê-las. Diz que visitamos um prostíbulo esta noite...







terça-feira, 17 de abril de 2018

hiperligação | 92º shooter : opus X - alive&kicking



ambiente próprio de um Clássico, quentinho qb e que se distingue de um ‘derby’ exactamente por isso mesmo.
no exterior estava tudo preparado ao milímetro e com atenção redobrada ao mais ínfimo pormenor, para que não houvesse violações dos perímetros de segurança, tão características por aquelas bandas e tão useiras e vezeiras pelos (in)suspeitos do costume. já no interior, tudo crepitava de calor humano, na ânsia de que o confronto tivesse início o mais rápido possível e os artistas surgissem para lhes satisfazer o seu ”glorioso” Ego. assim aconteceu e não foi preciso esperar muito para se perceber que seria um jogo disputado taco-a-taco.


a partida começou equilibrada, pese embora um maior ascendente dos da casa, apoiados pelo seu público, o qual rejubilava a cada vergastada infligida no adversário. é o que se diz de quem tem ”as costas quentes”…
já os forasteiros evidenciavam um manifesto incómodo por estarem a ser subjugados pelo arqui-rival e manietados na sua forma de jogar, tão característica ao longo deste campeonato (também) feito de E-toupeiras: pressão alta e jogo directo para os atacantes, poderosos no confronto físico com os defesas contrários. como tal não era possível, o pontapé para a frente foi o que mais se viu nos primeiros vinte minutos, para desespero do seu timoneiro, o qual não parou de se insurgir com os seus por não estarem a executar o plano de (pelo menos) uma semana intensa de preparos e de intenso trabalho.
apesar deste incómodo geral, o verdadeiro perigo tardava em surgir, até ao momento em que um deles surge isolado em frente ao último defensor e o obrigou a brilhar, parando um tiro que felizmente foi mal desferido e não causou mossa maior. foi esse o momento para que também houvesse retaliação por parte de quem não era bem-vindo naquela (espécie de) ”arena” e infligisse um pouco de ‘frisson’ na batalha.
chegados ao intervalo da contenda, o domínio da partida estava repartido e ninguém poderia afirmar-se superior ao outro – pese embora uns relatos enviesados de quem está acostumado a desvirtuar a Realidade e/ou a sonegar esta última a seu bel-prazer.


a pausa para retemperar energias foi benéfica para os que vinham de fora, os quais entraram com a ”pica toda”, resolutos em decidir a luta a seu favor. não se pouparam a esforços, impondo a sua lei e fazendo sofrer o adversário onde mais lhe doía: em sua própria casa. conseguiram causar dor, castigando-os com ataques fulminantes que tardavam em se materializar no que era tão desejado: a sua derrota. tal viria a acontecer mesmo no fim, pela parte de quem, em confrontos anteriores, fora alvo de chacota pelos adversários e inclusive de revolta pelos que também lutam pela mesma cor do estandarte. coisas complicadas de se perceber quando, na refrega de um combate, todos os que estão do nosso lado são válidos, para o tão necessário equilíbrio de forças…
em suma e para a História fica o resultado final: seis agentes feridos, sete detenções e o disparo de «tiros de aviso» por parte das forças de segurança.






aqueles números deveriam envergonhar, mais do que o mandante pelo apoio ilegal a esses «grupos organizados de sócios», que «nunca sube» da sua existência e que (literalmente) goza com o pagode – talvez porque usufrui de uma imunidade desportiva e de uma impunidade regulamentar como mais ninguém nesta República de bananas –, deveriam fazer corar de vergonha o responsável político pela gestão deste tipo de conflitos e que há dias afirmou «a Lei das Claques é ineficaz, não funciona. há poucos adeptos registados em relação ao número de clubes. queremos tornar a Lei eficaz». esse pamonha, se tivesse Brio, não só pelo cargo político que (ainda) detém, mas sobretudo pela sua pessoa, há muito que já teria resignado; pelos vistos e como o ”tacho” é apetecível, permanece em funções, num total desplante para com quem tem pedido Justiça neste ”faroeste” em que se tornou o comezinho futebolzinho tuga…


outra personagem menor do panorama político nacional e que se confunde com o desportivo, é o que, em tempos não muito idos, alarvemente disse «os grupos de adeptos organizados do 5lb deveriam registar-se para ficar como os outros [sic] mas, até agora, isso não tem sido um problema para o IPDJ nem para a polícia»…
alguém me pode informar se o sr Baganha já se demitiu ou se alguém já prestou esse favor ao País, no seguimento do que aconteceu nas imediações do antro de Carnide, e que envolveu os ilegais e assassiииos de Sempre? é para sossegar o espírito de alguns que invariavelmente alegam uma «invasão» ao Centro de treinos, na Maia e que, mais do que desconhecer a envolvente ao Estádio Vieira de Carvalho, ignoram a entrevista do actual Presidente da Associação Portuguesa de Árbitros de Futebol (APAF) ao DN, há um ano e que, entre outros considerandos, referiu que «não podemos dizer que eram elementos dos SuperDragões porque não se identificaram como tal ao Artur [Soares Dias]».



post scriptum pertinente:
para quem tem a paciência em ler os meus rudes considerandos e eventualmente estaria à espera de uma análise ao Clássico, peço desculpa pela desilusão mas há factores que não podem (devem?) ser sonegados porque se relacionam, de forma indelével, com o jogo que é praticado dentro das quatro linhas – e desde que o Caniggia se retirou do Futebol.



“disse!“

Miguel Lima | 92º minuto

(este espaço será sempre escrito de acordo com a antiga ortografia. limices.)