quarta-feira, 22 de julho de 2015

Zubaida, uma borboleta da noite.



- Julen!! Venham de lá esses ossos, maganyo! Estyava a ver que te tinhas olvidado da maltya.

- No, coño! - Abraço apertado. Gosto deste tipo, caso não tivessem ainda percebido. - Te vas a Barcelona, Silva?

- Pues claryo que si! Nem huviera Festivyal sem nosotros. 

- Bien, bien. Y que tal, te gustaran los partidos hasta ahora? - O velhote de sorriso desdentado junta-se a nós, com o seu ar lampião. O meu olhar deve bastar para o manter caladinho.

- Májomyenos. Me gustaram André, Sérgio, Danilo, Imbula. Me gusta Iker! Ai caraças, o que me gusta Iker!E Maxi tambyem. Pienso que tenemos un grandekypo. Y un gran entrenador. - Sorrio-lhe.

- Gracias amigo. Que va a ser duro... - Lixo-me para isto de falar castelhano (e que bem que me safo hein?!) e trato de lhe explicar direitinho:

- Olha Julen, claro que vai ser difícil. Sabes que contas com o meu apoio total e, naqueles momentos mais complicados, preparam-e aí uns pintxos e tudo. Mas é para fazer bonito este ano. Aliás, é para fazer muito bonito, em todo o lado! - O velhote franze o sobrolho. - Anda aqui basco dum cabrão, deixa-me contar-te a história da Zubaida. - Passo para o lado deles do balcão, sento-me entre os dois. Encho três copos de três de tinto. Conto-lhe:

"Quando conheci a Zubaida, ainda ela se chamava Zebedeu e trabalhava de paquete num escritório de advogados. Era um excelente rapaz, educado, prestável, amigo do seu amigo. Mas lá está, tinha aquela tendência para ser demasiado prestável e demasiado amigo de alguns dos seus amigos. No fundo, apesar do nome e da aparência e da penugem, pouca, que lhe encimava o lábio e se espalhava ao calhas pelo queixo, dentro daquele invólucro sempre viveu a Zubaida.

Aqui na Tasca, gostámos logo à primeira do moço. E custava-nos de tal maneira ver-lhe aquela infelicidade no olhar, que um dia alguém se lembrou, acho que foi o velho dos sapatos, de fazer uma vaquinha e ajudar na angariação de fundos para a conversão do Zebedeu em Zubaida. Como se fosse assim uma espécie de crisálida, estajaberohnão?! 

E pronto, com o nosso dinheiro mais todo o que ele já tinha juntado, lá assistimos todos orgulhosos ao nascimento da nossa Baidinha, como por aqui lhe chamamos até hoje. E vou-te dizer Julen, ganda naco, sim senhores. Rapidamente passou a ser bastante popular e requisitada, olarilas se era requisitada. 

Até que chegou aí um tipo e disse que ela havia era de participar num concurso todo catita. Miss Traveco Portugal ou lá o que era. Mas aquilo metia desfiles no estrangeiro e o diabo a quatro, se ganhasse cá e assim. Já imaginas o entusiasmo da rapariga. E nós, pais babados, tratámos de lhe arranjar as roupas e pagar as depilações e o ginásio e o camandro. 

Acontece que isto dos concursos de beleza para travecos é um mundo cão, pá. Juro-te que a nossa Baidinha era a málinda de todas. Mas o júri estava mais que comprado e, para sermos completamente justos, ela não sabia das manhas destas andanças e isso também a prejudicou um pedaço. E pimbas, ficou em segundo por uma unha negra, apesar da roubalheira. 

Mesmo não tendo ganho, a Baidinha ficou feliz, porque tinha consciência que era mais gaja e mais boa kajoutras. Até nós, que víamos a voar o nosso dinheirinho, estávamos convictos que a rapariga ia longe. Tanto assim que tratámos de lhe pagar um curso para desfilar nos trinques. Arranjámos um patrocínio de um dentista que lhe pôs aqueles dentes a brilhar mais que os holofotes do Dragão. Vou-te dizer pá, aquilo é que era. A gaja estava de se morder, não fosse sabermos que vinha com equipamento a mais de série. Aliás, eu cá acho que houve quem tivesse tentado dar umas dentadinhas mesmo assim. Adiante.

No ano seguinte, lá estava a Tasca em peso a fazer claque pela Baidinha. Toda ela recauchutada, a brilhar por entre a cambada de camafeus. Ate o júri, que continuava comprado, babava quando ela desfilava. Uns quantos deles de raiva, porque não estavam a ver como é que poderiam impedi-la de ser a Miss Traveco. Precisamente no desfile de fato de banho - Julen, não vás ver um desfile de fato de banho de travecos. Um gajo acaba a sentir-se humilhado pá! - a gaja vai e tropeça nos saltos que lhe tinhamos comprado por um preço que nem te vou dizer para não te assustar. Catrapumbas, esbardalha-se ao comprido na passerelle. Um bruaaa na sala, nós de coração apertado, os cabrões do júri com um sorriso cínico. Resultado: segunda outra vez. Atrás de uma gaja que parecia mais um gajo! Quer dizer, na verdade era mesmo um gajo, mas parecia uma gaja que parecia um gajo, foda-se!

Nessa altura tive que falar com a Baidinha e ser honesto com ela, até pelo apreço que todos lhe tínhamos. Disse-lhe:

- Olha Zubaida, tu vaitafodertábem?! Se não sabes andar de saltos, mete uns chanatos, pega numa sachola e vai cavar batatas, que tens bom corpo prá lavoura..."

- E tinha, Julen, muito bom corpo mesmo... - Concluo.

Reabasteço os copos. O basco assente com a cabeça repetidamente. O velho tens os olhos muito abertos. O primeiro diz:

- Comprendido, Silva. Ganar o ganar! Pero teremos pintxos, si?

- Siempre!

O velhote balbucia:

- A minha alma está parva! - O espanhol debruça-se para me tirar da frente do seu raio de visão e perguntar diretamente ao outro:

- Qué? - Ele responde-lhe:

- Mi almya estyá pyarvia!


...

Soundtrack to Zubaida's tale: Are you ready to fight?

4 comentários:


  1. @ Silva

    mas que belo texto, "olarilas", olari-lo-lelas :)

    obrigado pela gargalhada nocturna :)

    PS:
    vê lá se não te perdes por Barcelona e faltas à mística do e no Dragão :)

    abr@ço forte
    Miguel | Tomo III

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    1. Obrigado Miguel. Até eu achei graça à Baidinha. :)
      E o Dragão anda sempre comigo, como se prova no post já a seguir. Oh topa! :)
      Abraço

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